Carl Jung viu em si mesmo a inseparabilidade do ego e
da sombra, num sonho que descreve em sua autobiografia Memories, Dreams,
Reflections [Memórias, Sonhos, Reflexões]:
Era noite, em algum lugar desconhecido, e eu avançava
com muita dificuldade contra uma forte tempestade. Havia um denso nevoeiro. Eu
segurava e protegia com as mãos uma pequena luz que ameaçava extinguir-se a
qualquer momento. Eu sentia que precisava mantê-la acesa, pois tudo dependia
disso.
De súbito, tive a sensação de que estava sendo
seguido. Olhei para trás e percebi uma gigantesca forma escura seguindo meus
passos. Mas no mesmo instante tive consciência, apesar do meu terror, de que eu
precisava atravessar a noite e o vento com a minha pequena luz, sem levar em
conta perigo algum.
Ao acordar, percebi de imediato que havia sonhado com
a minha própria sombra,projetada no nevoeiro pela pequena luz que eu carregava.
Entendi que essa pequena luz era a minha consciência, a única luz que possuo.
Embora infinitamente pequena e frágil em comparação com os poderes das trevas,
ela ainda é uma luz, a minha única luz.
A sombra de Jung carrega o seu potencial de criatividade, inspiração e
de destruição, é tudo aquilo que ele não conhece de si
mesmo.
Muitas forças estão em jogo na formação da nossa
sombra e, em última análise, determinam o que pode e o que não pode ser
expresso. Pais, irmãos, professores, clérigos e amigos criam um ambiente
complexo no qual aprendemos aquilo que representa comportamento gentil,
conveniente e moral, e aquilo que é mesquinho, vergonhoso e pecaminoso.
Alcançamos a Totalidade quando integramos os opostos no
centro da consciência - não julgamos o outro porque reconhecemos o nosso
potencial na sombra pessoal e
coletiva.
A sombra age como um sistema imunológico psíquico,
definindo o que
Em 1945, Jung referia-se à sombra como simplesmente
aquela coisa que uma pessoa não queria ser. "Uma pessoa não se torna
iluminada ao imaginar formas luminosas", afirmou, "mas sim ao tornar
consciente a escuridão. Esse último procedimento, no entanto, é desagradável e,
portanto, impopular."
Tudo o que tem substância
lança uma sombra. O ego está para a sombra como a luz está para as trevas. Essa
é a qualidade que nos torna humanos. Por mais que o queiramos negar, somos
imperfeitos. E talvez seja naquilo que não aceitamos em nós mesmos — a nossa agressividade,
a inveja, o ódio, a violência e vergonha, a nossa culpa e a nossa dor — que
descobrimos a nossa humanidade.