quarta-feira, 5 de julho de 2023

Respiração e saúde emocional

 



                                       Respiração e Saúde  emocional

Todo impulso, no ser humano, é motivado pelo cérebro límbico e reptiliano. Porém, antes de ser expresso ou transformado em ação, precisa passar pela avaliação do ego, onde pode sofrer um condicionamento por parte do neocortex (NAVARRO, 1995).

Desta maneira, este impulso pode ser direcionado ou bloqueado através da contração da musculatura adequada, impedindo-o de se manifestar ou de originar um sentimento por não chegar à superfície, onde ocorrem a sensação e percepção (LOWEN, 2007).

Este condicionamento inicia na infância, pois desde muito cedo as crianças já aprenderam a segurar a “respiração para não chorar, puxavam o ombro para trás, tensionando o peito para conter a raiva e apertavam a garganta para evitar um grito” (LOWEN, 1984, p.33).

 Sendo que cada uma destas manobras causa a limitação da respiração. Esta contração inicia de forma consciente, porém quando se torna crônica, tanto a contenção como o seu sentimento se tornam permanentemente inconscientes (LOWEN, 2007).

Quando crescemos, permanecemos inibindo a respiração para reprimir os sentimentos. Por estes motivos, Reich (1998, p. 346) afirma que “a atitude de inspiração é o instrumento mais importante para a repressão de qualquer tipo de emoção”.

Baker (1980, p.79) reforça repetindo que “uma atitude crônica de inspirar é o meio mais eficiente de suprimir qualquer emoção”. Lowen (1984, p. 31) reitera dizendo que prender a respiração é o método mais eficiente de eliminar as sensações e Navarro (1995) elucida que não há comportamento sem esforço muscular e que toda a memória emotiva está ligada aos músculos.


  Ainda apontando a relação entre respiração e saúde emocional, pode-se citar a Body Encyclopedia, escrita por Marcher & Fich (2010), onde as autoras apresentam uma lista de funções psicológicas e do ego de 125 músculos do corpo humano, sendo que, entre eles é apresentado um grupo muscular que compõe a subcategoria responsável pela função de contenção das emoções.

 Este grupo abrange o diafragma, músculos intercostais, músculo transverso abdominal, músculo reto abdominal e músculo oblíquo interno e externo do abdome.

 Sendo estes, descritos por Machado (2008) e West (2002), como os principais responsáveis pelos movimentos respiratórios voluntários e involuntários, totalizando 90% da capacidade de captação de ar (ELIAS, 2008).

 “Em situações de estresse a maioria dos indivíduos tem a tendência de segurar a respiração” (LOWEN, 1984, p.36), pois os estímulos estressores captados pelos telerreceptores são descarregados, através do sistema neurovegetativo, principalmente no diafragma, o que altera seu funcionamento (NAVARRO, 1995).

Este padrão inadequado de respiração, por sua vez, provoca ansiedade, irritabilidade e tensão, que aumentam o nível de estresse, criando um ciclo que pode tornar crônico o estado de ansiedade.

Se esta dificuldade respiratória se tornar muito grave poderá levar ao pânico ou ao terror, como nos casos de claustrofobia e agorafobia. Uma respiração disfuncional pode gerar fadiga, depressão, falta de concentração e de eficiência, alterações na emissão da voz e diminuição do prazer sexual (LOWEN, 1984).

Boadella (1992) aponta que um padrão inspiratório crônico é característico de personalidades rígidas, que costumam ter propensão à hipertensão e ataques cardíacos.

 Por outro lado, sujeitos com padrão expiratório – onde a barriga tende a permanecer em estado de deflação – costumam ter dificuldade de concentração e de contenção.

RESPIRAÇÃO E PSICOTERAPIA Considerando a ideia de Lowen (1984, p. 33-34) de que “a incapacidade para respirar normalmente torna-se o principal obstáculo para se recuperar a saúde emocional” e que, assim como a inibição da respiração é utilizada para reprimir emoções e sensações, o caminho inverso também pode ser trilhado.

Sendo assim, através da estimulação da respiração profunda e plena, podem-se alcançar sentimentos e emoções reprimidos.

Por este motivo, a terapia bioenergética inicia seu trabalho com a respiração, com o objetivo de permitir que as ondas respiratórias se propaguem, sem bloqueios, por todo o corpo, ativando o sistema muscular e, assim, garantindo a espontaneidade e expressão dos sentimentos (LOWEN, 1984, LOWEN, 2007).

Um músculo contraído precisa de energia para se mover. Deste modo, o estímulo respiratório tem a função de supri-lo com oxigênio, favorecendo seus processos metabólicos, o que permite o estiramento muscular.

 Por sua vez, este estiramento causa vibração, que ajuda a afrouxar a contratilidade crônica dos músculos. Por fim, este afrouxamento da couraça, que gera vibrações por todo o corpo, libera os movimentos respiratórios profundos, permitindo a modificação do padrão típico involuntário de respiração disfuncional (LOWEN, 1984).

Compreende-se, então, que o exercício de respiração consciente é um auxiliar no processo, enquanto o verdadeiro efeito restaurador está em perceber e liberar as tensões que impedem o padrão respiratório natural (LOWEN & LOWEN, 1985).

 Lowen (2007) diz que respirar profundamente é sentir profundamente, e que esta respiração tem o poder de tocar e libertar sentimentos reprimidos. Boadella (1992) afirma que na medida em que as emoções são liberadas, os músculos tensos podem abrir mão de sua função defensiva.

 Volpi e Volpi (2003) dão ainda mais um passo ao explicar que na medida em que esta couraça muscular vai sendo diluída, há uma liberação da energia vegetativa e a reprodução das lembranças infantis que podem ser a base do sintoma ou transtorno presente.

 Deste ponto de vista, a respiração seria capaz não apenas de diminuir as tensões causadas pelo estresse, mas também de levar o paciente a fazer contato com sensações, sentimentos e emoções primitivas e aparentemente destrutivas, aceitá-las e, na medida do possível, permitir que fluam para a esfera da ação, onde deixam de ter domínio sobre o comportamento do indivíduo (VOLPI & VOLPI, 2003).



 Com objetivo de favorecer o relaxamento da musculatura contraída e auxiliar o paciente a tomar consciência e liberar suas tensões, a terapia bioenergética faz uso de massagens, pressão controlada, toques suaves e exercícios com movimentos apropriados.

 Estes, porém, por si só, não substituem a terapia (LOWEN & LOWEN, 1985). A bioenergética de Lowen (1984) não se restringe ao aspecto corporal do paciente. Todos os padrões de tensão crônica detectados, além da percepção de seus efeitos no funcionamento do corpo do indivíduo, devem ser investigados na busca de sua origem na história de vida do sujeito e também de seu significado no padrão de caráter atual do sujeito.

 Boadella (1992) relembra que Reich não aconselhava “terapias respiratórias” casuais, pois uma liberação rápida da respiração inibida poderia alterar a consciência e inundar o organismo com mais sensações do que ele poderia suportar, podendo chegar ao ponto de precipitar reações psicóticas.

Em alguns destes casos, o sujeito poderia sentir as correntes vegetativas como correntes elétricas aterrorizantes ou sensações messiânicas de contato sobrenatural, sem estabelecer qualquer contato entre estas sensações e a realidade ou o mundo externo.

Como a incapacidade de respirar de forma natural e plena é tomada como o principal obstáculo para se recuperar a saúde emocional, a estimulação da respiração e as inspirações profundas podem ser utilizadas para levar o paciente à percepção de sua contenção e ativar sentimentos e sensações que permaneciam reprimidos por serem dolorosos ou ameaçadores demais.

 Porém, o simples exercício respiratório não é capaz de restaurar o estado de espontaneidade e o livre fluxo da energia no organismo, pois as próprias técnicas representam uma forma de controle que vai contra o real objetivo de abandonar-se à respiração ao invés de fazê-la (LOWEN, 1986).

 É necessário, portanto, que haja um reequilíbrio da energia emocional ligada ao equilíbrio da respiração (BOADELLA, 1992).

Uma vez que, uma emoção bloqueada é um estresse para os músculos (LOWEN, 1984), cabe ao terapeuta ajudar esse indivíduo a acessar e aceitar seus sentimentos e sensações, e permitir que eles cheguem à esfera da ação. Ele então perceberá que pode se entregar ao sentimento e controlar a ação ao mesmo tempo, fortalecendo assim, o seu ego (LOWEN, 1986).

 Com este objetivo o setting terapêutico se apresenta como um ambiente de segurança e acolhimento, onde o paciente pode perceber que, ao entregar-se verdadeiramente aos seus sentimentos, ele é capaz de tomar posse de suas ações.

 Sempre que o indivíduo se permite a este tipo de vivência, a tensão que mantém seu padrão de contenção é diminuída e, por consequência, há um aumento de energia do organismo e um aprofundamento natural de sua respiração.

 A cada um destes momentos de cura, ser e sentir deixam de representar o mesmo perigo que anteriormente (LOWEN, 1986).

CONCLUSÃO Enquanto ferramenta da psicologia corporal, a respiração “acompanha todas as técnicas destinadas a liberar as tensões específicas em determinadas partes do corpo” (BOADELLA, 1992, p. 20), tendo como objetivo dissolver os bloqueios que impedem o livre fluxo dos movimentos do organismo.

 Tal processo reestabelece o padrão respiratório pleno e unitário que envolve todo o corpo e que acompanha a relação saudável e racional entre as pessoas e o ambiente.

 Desta forma, a técnica respiratória é utilizada como ferramenta para a restauração de sua própria funcionalidade, ou seja, para a recuperação da condição de respiração sadia a que todos os indivíduos neuróticos não se permitem entregar.



Sua forma de utilização poderá ser moldada de acordo com o objetivo do trabalho, corrigindo distúrbios de padrões respiratórios deficitários ou fragmentados.

 O trabalho respiratório deve sempre iniciar pela reestruturação e reforço do ego, caso contrário, o indivíduo poderá não integrar o que sente com o mundo real, pelo medo que tais sensações lhe representam.

 Além do fato de que algumas pessoas estão tão acostumadas com um nível de deficiência na sua respiração, que necessitam de um trabalho gradual para aprender a tolerar níveis mais elevados de vitalidade.

 Por conta disso, é muito importante que o psicólogo saiba reconhecer as necessidades do paciente em relação à inspiração ou expiração, sendo estas funções intrínsecas aos estados de retenção e liberação emocionais. (BOADELLA, 1992)

REFERÊNCIAS BOADELLA, David. Correntes da vida: uma introdução à biossíntese. 2.ed. Tradução de Cláudia Soares Cruz. São Paulo: Summus, 1992, 198 p. ELIAS, Marco Teixeira. A fisiologia da respiração e o psiquismo humano. In: ENCONTRO PARANAENSE, CONGRESSO BRASILEIRO DE PSICOTERAPIAS CORPORAIS, 14. 9., 2009, Curitiba. Anais... Curitiba: Centro Reichiano, 2009. Disponível em: www.centroreichiano.com.br/artigos_anais_congressos.htm Acesso em 30 jan. 2017. MARCHER, Lisbeth; FICH, Sonja. Body encyclopedia: a guide to the psychological functions of the muscular system. Berkeley, Califórnia: North Atlantic Books, 2010, 545p.

 COMO REFERENCIAR ESSE ARTIGO VIEIRA, Fabio Martins; VIEIRA, Andressa Santos; FERNANDES, Gisele Jacinta Rodrigues Calegari; REICHOW, Jeverson Rogério Costa. A respiração como ferramenta de intervenção da psicoterapia corporal. In: VOLPI, José Henrique; VOLPI, Sandra Mara. Psicologia Corporal. ISSN-1516-0688. Curitiba: Centro Reichiano, 2018. Disponível em: http://www.centroreichiano.com.br/artigos[1]cientificos/ Acesso em: ____/____/____. 10 | www.centroreichiano.com.br

LOWEN, Alexander. O prazer de estar cheio de vida. In:______. Prazer: uma abordagem criativa da vida. 6.ed. Tradução de Ibanez de Carvalho Filho. São Paulo: Summus, 1984, p.29- 54.

LOWEN, Alexander; LOWEN, Leslie. Exercícios de bioenergética: o caminho para uma saúde vibrante. 7.ed. Tradução de Vera Lúcia Marinho e Suzana Domingues de Castro. São Paulo: Ágora, 1985, 196 p.

 LOWEN, Alexander. Medo da Vida: caminhos da realização pessoal pela vitória sobre o medo. 9.ed. Tradução de Maria Sílvia mourão Netto. São Paulo: Summus, 1986, 254 p.

 LOWEN, Alexander. Respiração. In:______. A espiritualidade do corpo: bioenergética para a beleza e harmonia. Tradução de Paulo Cesar de Oliveira. 12.ed. São Paulo: Pensamento, 2007, 229 p.

MACHADO, Maria da Glória Rodrigues. Anatomia e função dos músculos respiratórios. In:______. Bases da fisioterapia respiratória: terapia intensiva e reabilitação. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2008, p. 1-9)

 NAVARRO, Frederico. Caracterologia pós-reichiana. Tradução de Cibele dos Santos Coelho. São Paulo: Summus, 1995, 93 p.

PEREIRA, Gerson Cotta. Embriologia e histologia do sistema respiratório. In: BETHLEM, Newton. Pneumologia. 4.ed. São Paulo: Atheneu, 2002, p.3-22.

 REICH, Wilhelm. A linguagem expressiva da vida. In:______. Análise do caráter. 3.ed. Tradução de Ricardo Amaral do Rego. São Paulo: Martins Fontes, 1998, p.329-366.

VOLPI, José Henrique; VOLPI, Sandra Mara. Reich: da vegetoterapia à descoberta da energia orgone. Curitiba, PR: Centro Reichiano, 2003, 144 p.

 WEST, John B. Fisiologia respiratória. 6.ed. Tradução de Dr. Constantinos D. Lambrinidis. Barueri, SP: Editora Manole Ltda, 2002, 199 p.

ZIN, Walter. Fisiologia do sistema respiratório. In: BETHLEM, Newton. Pneumologia. 4.ed. São Paulo: Atheneu, 2002, p.39-54.

AUTORES Fabio Martins Vieira / Criciúma / SC / Brasil Bacharel em Psicologia pela Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC (CRP – 12/16129). Psicoterapeuta corporal pelo Instituto Holon. Psicólogo clínico. E-mail: fabiovpsico@gmail.com Andressa Santos Vieira / Içara / SC / Brasil Bacharel em Psicologia e Especialista em Saúde Coletiva pela Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC (CRP – 12/14391). Psicoterapeuta corporal pelo Instituto Holon. Psicóloga clínica. E-mail: andressavsr@hotmail.com

COMO REFERENCIAR ESSE ARTIGO VIEIRA, Fabio Martins; VIEIRA, Andressa Santos; FERNANDES, Gisele Jacinta Rodrigues Calegari; REICHOW, Jeverson Rogério Costa. A respiração como ferramenta de intervenção da psicoterapia corporal. In: VOLPI, José Henrique; VOLPI, Sandra Mara. Psicologia Corporal. ISSN-1516-0688. Curitiba: Centro Reichiano, 2018. Disponível em: http://www.centroreichiano.com.br/artigos[1]cientificos/ Acesso em: ____/____/____. 11 | www.centroreichiano.com.br 

ORIENTADORES Gisele Jacinta Rodrigues Calegari Fernandes / Criciúma / SC / Brasil Bacharel em Psicologia pela Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNESC (CRP – 12/06246). Especialista em Psicologia Corporal pelo Centro Reichiano. Cursando Pós Graduação em Psicanálise pela UNESC.  E-mail:giselejacinta@gmail.com

 Postado por Dharmadhannya


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