A Pessoa do Espírito
Santo
: mistério de
amor e irrupção do novo
Quem
é o Espírito Santo? O motor da libertação integral
O
Espírito Santo é aquele que supera a relação Eu-Tu (Pai-Filho) e introduz o
Nós.
Por
isso o Espírito Santo é por excelência a união entre as Pessoas divinas; é a
Pessoa que revela para nós mais claramente a inter-relação eterna e essencial
entre os divinos Três.
Na história, o Espírito se mostra como uma
força vulcânica, como um vendaval que toma as pessoas e as leva a fazer obras
grandiosas.
Por
fim o Espírito é a força criadora de diferenças e de comunhão entre as
diferenças. E Ele que suscita entre as pessoas os mais diversos dons e nas comunidades
os mais diferentes serviços e ministérios, como se ensina nas epístolas aos
romanos (12) e aos coríntios (12).
Mas
esta diversidade não decai em desigualdades e discriminações. Todos bebemos do
mesmo Espírito (ICor 12,13). Os dons não são dados para a autopromoção, mas
para o bem da comunidade (ICor 12,7).
O
Espírito foi derramado sobre todos. Ele habita os corações das pessoas,
dando-lhes entusiasmo, coragem e determinação. Ele consola os aflitos, mantém
viva a utopia nas mentes humanas e no imaginário social, utopia de uma
humanidade totalmente redimida, e dá força para
antecipá-la, mesmo por revoluções dentro da
história.
Ele
é uma Pessoa divina junto com o Filho e o Pai, emergindo simultaneamente com
Eles e estando essencialmente unidos a Eles pelo amor, pela comunhão e pela
mesma vida divina.
Biblicamente
o Espírito é como um tufão e um vendaval. É
uma força transformadora como o amor que é
mais forte do que a morte.
O
Espírito não é, como para a nossa cultura, algo etéreo e indefinível. Que
dinamismo não deve conter a espiritualidade se aceitarmos o Espírito como
energia vital e sempre inovadora?!
Assim ocorre com os líderes carismáticos como
os Juízes, com os profetas, com o servo sofredor que luta pelo restabelecimento
do direito e da justiça, com os reis, investidos de poder para proteger o
povo, com o Messias, portador de todos os dons do Espírito. Cabe ressaltar
algumas características do Espírito.
Ele
é a força do novo e da renovação de todas as coisas: cria ordem na criação, faz
surgir o novo Adão no seio de Maria, impulsiona Jesus para a evangelização,
ressuscita o crucificado dos mortos, antecipa a humanidade nova na Igreja e nos
traz, no final, o novo céu e a nova terra.
O
Espírito é o atualizador da memória de Jesus, o Libertador. Nunca deixa que as
palavras de Jesus permaneçam
mortas,
mas que sempre sejam relidas, ganhem novas significações e implementem novas
práticas.
O
Espírito é o princípio libertador das opressões de nossa situação de pecado,
chamada pela Bíblia de carne. Carne expressa o projeto da pessoa voltada sobre
si mesma, esquecida dos outros e de Deus.
Espírito sempre é gerador de liberdade (cf. 1
Cor 3,17), de entrega aos demais e de amor. O Espírito é o pai dos pobres,
incutindo-lhes esperança para sacudir as opressões que suportam, fazendo-os
sonhar sempre com um mundo reconciliado e justo e lutar para realizá-lo.
Missão
do Espírito Santo: unificar e criar o novo
A
ação do Espírito Santo na história é reflexo de sua ação no seio da Trindade.
Aqui Ele é princípio de diversidade e de união entre os distintos (Pai e
Filho).
Por isso é amor e comunhão por excelência, embora
cada Pessoa divina seja comunhão e amor. Sempre que na história nos encontramos
com os dinamismos de amorização, de congraçamento, de convivência das
diversidades, aí discernimos a presença inefável da ação do Espírito Santo.
O Espírito está ligado à ação transformadora e
inovadora. Sua ação penetra os atos humanos fazendo com que eles sejam
realizadores do desígnio da Trindade. Especialmente os agentes históricos, os
líderes carismáticos, os criadores de novos horizontes, os desbravadores de
novos caminhos são expressões da força do Espírito Santo.
Mas particularmente os pobres quando resistem
contra as opressões, quando se organizam para buscar a vida, o pão e a
liberdade, quando no meio das lutas conservam a fé e a ternura para com os
outros, são os grandes sacramentos históricos da presença atuante do Espírito
Santo.
O
Espírito Santo está ligado ao novo e ao alternativo. Sempre temos a ver com
leis, hábitos e instituições. Estas instâncias nos dão segurança e nos garantem
uma direção. Mas o espírito humano está sempre aberto para cima e para frente,
e é insaciável.
De tempos em tempos surgem as crises de
identidade; as estrelas de nosso céu se escondem. As sociedades sentem a
necessidade de novos caminhos. Acontecem revoluções que deixam para trás
veneráveis instituições e caminhos batidos.
Abrem-se
sendas novas. Cria-se uma nova ordem. O Espírito Santo está sempre presente
nestes processos, geralmente dolorosos, de mudança estrutural. E Ele que
inaugura o novo céu e a nova terra.
Poderíamos figurativamente dizer que o
Espírito Santo é a imaginação criativa de Deus. Especialmente na Igreja atua o
Espírito, pois ela é o sacramento do Espírito de Jesus.
Ao lado de sua estrutura legítima de poder
existe o carisma que vem do Espírito. O Espírito Santo atualiza a mensagem de
Jesus, não deixa que na comunidade impere o autoritarismo, nem que nas
celebrações vigore o ritualismo, nem que na reflexão cristã se caia na
aborrecida repetição das fórmulas.
Nos
sacramentos, particularmente na Eucaristia, se mostra a eficácia salvadora do
Espírito. Ele vem como graça que diviniza nossa vida e, por sua atuação, as
palavras de Cristo que instituíram o sacramento eucarístico ganham eficácia e
nos trazem a santa humanidade de Cristo em nosso meio, sob a forma de pão e de
vinho.
Que
seria da sociedade e das Igrejas se não surgissem os inovadores, as pessoas
criativas, que têm ideias novas, inventam novos ritmos, descobrem novos
caminhos para a educação, culinária, agricultura, a política e a religião? E
por essas dobras do tecido social que se manifesta o Espírito Santo criador e
doador de vida.
A
relação única entre o Espírito Santo e Maria
O
Espírito Santo juntamente com o Filho foi enviado à Terra, para santificar
todas as criaturas e reconduzi-las ao seio da Trindade.
Quem
acolheu a vinda do Espírito Santo? A quem Ele veio pessoalmente e em total
entrega?
A
reflexão teológica não precisou até hoje de forma clara este ponto. Sabemos,
sim, que o Espírito está na vida de todos os pobres e de todos os justos da
história, que mais densamente está na comunidade dos fiéis, que atua
particularmente nos sacramentos e dá uma assistência infalível ao papa, quando
este fala para toda a Igreja, para expressar a fé desta mesma Igreja de forma
conscientemente vinculante para todos os fiéis.
Mas
não poderíamos concretizar melhor a presença pessoal do Espírito no tempo, como
o fazemos e o sabemos com referência ao Filho? O Filho foi acolhido pela santa
humanidade de Jesus;
é
a essência do mistério da encarnação, a união inseparável e inconfundível
entre a realidade humana e a realidade divina em Jesus de Nazaré, Filho de Deus
e nosso irmão carnal. Não poderíamos procurar uma semelhança com referência ao
Espírito Santo?
Efetivamente, cabe à reflexão respeitosa dos
cristãos elaborar uma hipótese (theologúmenon) que não ofenda as demais
verdades da fé e que avance no conhecimento e no amor da Santíssima Trindade.
Não
se trata de nenhuma doutrina oficial que possa ser ensinada nas aulas de
catequese. Trata-se de um esforço, marcado pela unção e pelo respeito, de ver
mais profundamente os mistérios de Deus que sempre nos desafiam e nos convidam
a uma penetração maior. Vamos expor semelhante hipótese teológica.
Há
um texto de São Lucas que nos parece iluminador; com referência a Maria, diz:
“O Espírito Santo virá sobre ti e a virtude do Altíssimo te cobrirá com sua
sombra e é por isso que o Santo gerado será chamado Filho de Deus” (1,35).
Aqui
se diz que o Espírito há de vir sobre Maria, como de fato veio. “Cobrir com sua
sombra” é a expressão bíblica para dizer que o Espírito arma sua tenda em
Maria, quer dizer, terá aí uma presença palpável (cf. Ex 40,34435).
Com
razão o Concilio Vaticano II chama Maria de “sacrário do Espírito Santo” (LG
53). A presença do Espírito em Maria faz dela mãe; transforma sua maternidade
de humana em maternidade divina.
Por
isso, o que nasce dela “é Filho de Deus”. O concilio diz: “Maria é como que
plasmada pelo Espírito Santo e formada nova criatura” (LG 56). Dizer que é “como
que plasmada pelo Espírito Santo” implica reconhecer uma relação única com a
Terceira Pessoa da Santíssima Trindade.
Realiza-se
então a máxima dignificação da mulher, à semelhança do varão com Jesus. Varão e
mulher são imagem e semelhança de Deus, da Santíssima Trindade (Gn 1,27).
Ambos
participam da divindade, cada qual a seu modo próprio, mas real e
verdadeiramente. Nós, irmãos e irmãs de Jesus e de Maria, participaremos em
união com eles e no modo próprio a cada um de nós.
Leonardo Boff
Livro a Santíssima Trindade é a melhor comunidade.
Editora Vozes.
Postado por Dharmadhannya
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