Como há o reino
da alegria, existe também um mundo onde a diversidade não existe; onde só há a
unidade. É superior ao reino da alegria, pois se a alegria é o reino das ideias
universais, a unidade está atrás das ideias. Não podeis falar com nenhuma
exatidão acerca deste reino, porque as palavras são diversidades.
Portanto, só uma
palavra serve para a denominação deste reino: é o reino da unidade. Não somente
não há necessidade ali de outras palavras; não existem outras palavras, pois
só a palavra “unidade” expressa tudo. Analisar é perdê-la, sintetizar é
perdê-la; a unidade não pode ser analisada nem sintetizada: é una.
O que se há de
utilizar então nos mundos inferiores? Isto: obtendo-lhe o sabor. O sabor
da unidade pode ser provado pela mente, e ainda pode expressar-se em ação como esforço
mútuo. Sempre que há um esforço mútuo ...nos mundos inferiores, é que os
homens captam o sabor da unidade. A unidade das Almas, das Mônadas, dos
anjos...
Nos mundos superiores; acima da mente, nenhuma
outra coisa existe, oque nossa consciência alcance – o mundo sem formas; porque
eles se acham mais próximos do mundo da unidade: a unidade é sua verdadeira
vida. Sobre ela, talvez uma sentença a exprima com acerto; é a incorporação da
vontade de Deus.
Desta vontade irresistível nada pode saber o
homem dos mundos inferiores. Que ela manifesta todas, que mantém todas coisas
em existência, que é o poder impulsionante por trás de toda a vida, estas
coisas se podem saber, mas são seus atributos e não a vontade em si.
Pela vontade o homem pode elevar-se através do
pensamento, através do reino das ideias e
ainda através da unidade, até o puro Eu, ou Eu superior, ou Mônada. Então ele pode conhecer a vontade de Deus.
Este é um
caminho que todo homem pode tomar imediatamente, um caminho que algum dia ele
tomará irremissivelmente. Se quer abreviar a jornada no mundo da forma, se sua
alma está farta de forma e separação, volte-se, ponha-se no caminho por onde
veio, o antigo e bem trilhado caminho, o caminho que tantos de sua raça e da
nossa têm palmilhado.
Este caminho
está a seus pés; ponha-os nele. Passa por seu coração, terá de pagar pedágio com
o sangue de seu coração. Conduz por meio de sua mente; ele tem de estar disposto
a deixar de lado sua mente inferior e alcançar o mundo da Alma, da mente
superior.
Então ele encontrará a ponte, a ponte tão difícil de atravessar,
porque o caminho é muito estreito ali; porém, cada passo dado, alarga-o.
A raça humana se
encontra hoje nas proximidades desta ponte. A etapa seguinte na evolução da
mente humana levará à travessia da ponte; conduz do concreto ao abstrato, do pensamento à ideia, da separação à união, da forma à informidade, do impermanente ao
permanente,
do mortal ao imortal, do ilusório ao real, do temporal ao eterno,
do que fenece ao que é imperecível; do homem natural ao espiritual, do Não-Eu
ao verdadeiro Eu ou Espírito.
É a ponte que
foi atravessada por todos os santos, é a linha divisória entre espírito e
mente. Não é um lugar, é um estado; não é exterior, está dentro.
Atravessada a
ponte, os lugares desaparecem; restam apenas estados de consciência. Quem quer
atravessá-la, deve deixar-se ficar atrás; primeiro, porque nenhum eu separado
pode entrar no estado de união com o Uno;
e segundo, porque o eu deve
permanecer nos mundos inferiores como mensageiro e embaixador entre ambos os
reinos separados pela ponte.
Tendo pago
pedágio com o sangue do seu coração, sacrifício da personalidade ou do ego
estando disposto a deixar de lado sua mente, avance intrepidamente o bravo
peregrino para a ponte, e imediatamente se encontrará do outro lado.
A ponte não mais
o sustentará; só ao atravessá-la pode utilizar-se do seu apoio. Atravessada a
ponte, encontra-se no reino da alegria, onde a dor é deixada atrás para sempre,
onde a separação é desconhecida, onde reside o conhecimento.
Chegou ao primeiro lugar de repouso. Aqui
encontrará a paz; aqui renovará sua coragem e sua força para as sucessivas
etapas de sua peregrinação; aqui inspecionará o caminho percorrido:
o passado e
o presente serão aqui unificados; aqui poderá apreciar o futuro, recolher os
numerosos arroios de energias que libertou no passado, e reuni-los num só.
Agora começará a
dirigir esta única corrente de energia. Não flutuará sobre as ondas à mercê da
correnteza; daí por diante terá domínio sobre si mesmo. Conhecendo o passado,
estará de posse do futuro.
Aqui juntará os
produtos de suas inúmeras vidas e calculará o seu valor; aqui equilibrará as
causas e efeitos; aqui começará a ser o governador de ambos, reconhecendo-os
como um; aqui resumirá num todo as experiências zodiacais de suas muitas vidas.
Assim, somente assim, pode o
homem inferior regenerar-se nos mundos inferiores. Esse é o significado da
nova vida. O homem deve morrer para o seu eu inferior, a fim de poder alcançar novo
nascimento no eu superior.
Assim como ao
morrer na terra, ele encontra nascimento nos mundos do sentimento e do
pensamento, pode-se também dizer que ele morre ao retrair-se da soberania da
forma.
Não o colocam
numa sepultura nem seu corpo desaparece da vista dos homens; porém, em verdade,
ele morre. Este é o significado da crucificação: a morte, essencial ao
nascimento. Todo homem tem de percorrer o caminho que o Salvador percorreu.
Há uma ordem
cíclica neste nascimento e morte. A crucificação no final do ciclo conduz ao
nascimento no começo do seguinte. Nas espirais sem fim deve repetir-se o grande
drama, ascendendo sempre o homem ao representá-lo.
Pode-se bem chamar de crucificação, porque a
morte na cruz dos mundos materiais tem de ser repetida dia a dia, hora a hora,
minuto a minuto, por quem quer trilhar a Senda.
Não creia o
homem que pode ocultar-se atrás de um texto ou dar um passo na escada em
espiral, confiando nas aflições dos outros, embora sejam grandes personagens.
Esta ilusão é que tem retardado o progresso do
mundo ocidental: que pelos sofrimentos de outrem possam ser esquecidos os seus
pecados, com os quais, no entanto, ele é autoindulgente; que, banhando-se no
sangue alheio, possa chegar aos pés de Deus. Ensinamentos tais podem trazer
conforto às massas, pois em seu bojo subsiste uma verdade, conquanto muito
distorcida.
Mas quem quer
salvar as massas tem que pôr de lado esses ensinamentos; confiando só
na força de sua divindade inerente, pode encontrar e trilhar a Senda.
Quando a grande
determinação houver nascido dentro de seu coração; quando tiver dado o
primeiro passo, com ele estará e partilhará generosamente seu sangue o auxílio
de muitos Salvadores.
Esta é a verdadeira unificação que um dia
será aprendida. Eles, os Homens Libertos, os Grandes Seres da Terra, os Santos
Perfeitos, os Santos Seres de Deus, os Guias e Mestres das grandes hostes
angélicas, os Governadores Internos do mundo, as Sentinelas que jamais
adormecem;
Aqueles cujas
mãos nunca se cansam, não obstante estarem sempre cheias de trabalhos pelo
mundo e cujos olhos estão plenos de compaixão, poder, amor e infinita
bondade... Eles permanecem, ordens sobre ordens, vivendo em reinos além do
reino de paz e alegria, em perfeita unidade com Aquele de Quem nasceram.
Eles e Suas hostes angélicas saúdam o peregrino;
enviam-lhe força, carinho e conforto em suas provas. Eles lhe emprestam anjos
para guiá-los na Senda. Eles sorriem a cada uma de suas quedas, sabendo que
seus próprios êxitos cresceram em grande parte de suas quedas.
Eles lhe escondem dos olhos o esplendor de
seus próprios sucessos, receosos de que o orgulho o dispa da humildade. Se de
Suas esplêndidas alturas Lhes fosse possível sentirem um toque de medo, este medo
seria em relação a quem tentasse a Senda sem haver ainda morrido para o
orgulho.
Ajudado pela luz
dos Grandes Seres, seus grandes precursores, tendo se afastado da ignorância e
superstição das massas, potente na força de sua divindade, o peregrino sobe a
montanha, aprendendo a morrer continuamente, crucificando-se voluntariamente
nos mundos da forma para nascer nos mundos sem forma.
Mortifica sua
carne, porém não na cova do ermitão nem na cela monástica, nem em penitências
que destroem a beleza pura da carne. Mortifica-se pela inteligência e vontade;
seu ascetismo é o auto- refreamento em tudo; sua penitência é o sacrifício de modo
o que possa embaraçar seu progresso na Senda; porém, não conhece tortura, e
rara vez, em seus primeiros dias, sente angústias da alma*.
Embora morra
assim continuamente e sofra todas as angústias da morte, não é infeliz. Está
cheio de alegria, porque sabe que toda angústia que sente, todo espinho ou
lança que o fere, aumentam seu poder; quanto mais sangue verte de suas feridas
para o mundo inferior, tanto mais sangue lhe flui.
Assim chega ele
a conhecer o mistério das mãos, pés e lado lacerados. Sabe que só quando suas
mãos forem atravessadas por espinhos, poderá estendê-las e salvar o mundo; que
só quando seu corpo estiver curvado sob a cruz, poderá sustentar seu peso e
seguir o seu caminho; que só quando levar a coroa de espinhos, poderá emanar de
si o régio poder.
Sabe que só
quando seu lado tiver sido lanceado, só quando a lança do soldado (símbolo da
contenda, separação e dor) lhe tocar o coração, poderá pagar o pedágio para
percorrer o caminho; que dando o sangue de sua vida, vai se aproximando mais do
reino da alegria, onde a luta, a separação e a dor já não o podem ferir.
No próprio ato
de dar, ouve o eco das vozes dos cantos dos anjos naquele reino. Em meio de sua
obscuridade e dor, lhe vem um raio de luz, como de uma vela acesa na janela de
seu lar espiritual.
Assim, sempre
que ele morre ou se crucifica nos mundos da forma, os homens se assombram de
sua firmeza, de que mesmo em meio do sofrimento sorria, de que mesmo nas
trevas da agonia, seus olhos brilhem.
Os homens não
sabem, nem podem saber, que ele ouve a música e tem a visão do mundo superior,
e que, ante esta música e alegria, a dor desaparece. Embora a Senda esteja cheia
de dor, também poderá chamar-se Senda da alegria. Pode-se acrescentar que a
alegria é maior do que a dor; a luz maior que a obscuridade. A lua, antes de
ocultar-se, estampa em sua face os primeiros raios do sol nascente.
Tratei de expor
a história do homem imortal, que voluntariamente se submeteu à reclusão na
forma, o terrível fardo da carne. Tendo suportado a prisão da carne por muitas
vidas, através de muitos séculos, agora cuida de colher os frutos.
Para isso
terá de separar sua parte imortal da mortalidade em que andou encerrado; terá
de modificar ao hábito de um milhar de vidas e de se libertar da forma. O
Salvador o chamou pródigo.
Assim percorre a
Senda, suspirando sempre pelo embelezamento, cultivo e refinamento de seus
veículos, seus instrumentos, para que, depois de morto para eles e para o seu
domínio, e obtido seu nascimento em outros mundos, ele possa usá-los e neles
encontrar um diamante de muitas facetas que pode polir mais ainda;
cujas muitas facetas pode agora aperfeiçoar,
para que, através de sua beleza transluzente a nova glória que é sua, possa
brilhar para auxílio de seu próximo. Tal é a sua atitude para com o corpo e a
forma; sempre os vê como material para aperfeiçoar e embelezar.
Este é o quadro
de seu crescimento interno e externo. Dentro, percorre a Senda, encontra a
ponte, atravessa-a e identifica-se com aquilo de que é um fragmento;
e reconhece-se como parcela encarnada, um raio
isolado da luz dos mundos da luz que ilumina uma porção do mundo inferior. A
parcela se converteu agora no todo; o raio se retirou para a sua origem, a luz.
O trabalho externo do peregrino consiste em
polir a matéria que usou desde que se manifestou como parte separada; em
dar-lhe uma translucidez perfeita.
Este é o
significado da morte e nascimento espirituais. Não é uma morte segundo o homem
a considera, porque evidentemente a forma continua, vive e respira, porém,
simbolicamente, ele morre, porque se retira da forma.
Entre o que os homens chamam morte e a morte
simbólica há uma diferença: na morte da carne, esta se desintegra, e na morte
simbólica, conserva-se.
Esta morte se refere antes ao poder da forma e
ao seu domínio sobre a vida. Para isto ele verdadeiramente morre. Na morte
efêmera há um momento em que os homens podem dizer “vive”, outro em que podem
dizer “morre”, e outro em que podem dizer “morreu”; porém na morte de quem
renasceu, a morte é contínua.
Este é um mistério que só aquele que percorre
a Senda pode resolver. Se quiserdes compreendê-lo, buscai a estrada.
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