“A busca da felicidade’
Pesquisas desvendam os mecanismos do prazer e da felicidade.
Como esse novo conhecimento pode melhorar sua vida? por Barbara Axt – Revista
SuperInteressante.
Damos importância demais a escolhas que não são tão
definitivas assim e esquecemos que uma decisão “errada” não é o fim do mundo. É
uma questão de colocar limites nos nossos desejos. Em outras palavras, ser
feliz é muito mais simples do que se pensa.
Simples? Então explique
Tem uma ideia central: não leve tudo tão a sério. “Leveza” é
a palavra-chave. Não quer dizer que todos devamos instalar um sorriso
permanente no rosto e começar a achar bom tudo o que acontece.
Leveza significa
entender que até as melhores sensações têm fim, assim como não há aborrecimento
que dure para sempre. Não é para se tornar um bobo-alegre: às vezes as
circunstâncias nos obrigam a reagir de jeito negativo, e isso não é
necessariamente ruim.
Gianetti chama atenção para a diferença entre “ser feliz” e
“estar feliz”. “Existem pessoas que levam uma vida cheia de momentos de prazer,
mas que não têm um caminho ou um significado.
No extremo contrário
estão aqueles que abrem mão do ‘estar feliz’ por só pensar no futuro e viver
com prudência demais”. Talvez o melhor caminho esteja entre esses dois.
Atingir esse equilíbrio não é moleza e infelizmente não há
fórmula mágica nem manual completo. O lance é prestar atenção a si mesmo e ir
mudando aos pouquinhos. “As transformações mentais demoram e não são fáceis.
Demandam um esforço constante”, aconselha o dalai.
Felicidade não é um fim em si, e sim uma consequência do
jeito que você leva a vida. As pessoas que procuram receitas e respostas
complicadas para ela acabam perdendo de vista os pequenos prazeres e alegrias.
É o dia-a-dia de uma pessoa e a maneira como ela reage às situações mais banais
que definem seu nível de felicidade.
Ou, para resumir
tudo: um jeito garantido de ser feliz é se preocupando menos em ser feliz.
A receita da felicidade
Esses métodos para se tornar mais feliz foram testados em
laboratório. E funcionam
Prazer
• Permita-se ter experiências sensorialmente agradáveis de
vez em quando. Não se trata só de emoções fortes. A maior parte dos prazeres é
bem simples: conversar, ver uma paisagem bonita, comer algo gostoso.
• Tire “fotografias mentais” dos momentos agradáveis de sua
vida – repare nos detalhes, nas cores, nos cheiros. Nas horas difíceis, tente
recordar-se de tudo.
• Tenha companhia. Quase todas as pessoas sentem-se mais
felizes quando estão com outras pessoas. Claro que isso não significa evitar a
solidão a qualquer custo, mas é importante ter amigos.
Engajamento
• Dedique-se a tudo que você faz, no trabalho ou fora.
Lembre-se: a diferença entre um emprego chato e um emprego legal pode ser a sua
postura. Se você se envolver mais, ele vai ficar mais divertido.
• Arrume uma atividade desafiadora, difícil, e esforce-se
para se tornar cada vez melhor nela. Yoga, aeromodelismo, videogame, natação,
flauta, mountain bike, culinária vegetariana, bateria. Há opções para todos os
gostos.
• Exercite-se. Esporte praticado com frequência aumenta a
disposição para a vida e em geral nos deixa mais ligados no mundo e no nosso
próprio corpo. Algumas pesquisas sugerem que dar risada é um ótimo exercício.
Significado
• Pesquisas mostram que escrever num diário as coisas pelas
quais você é grato garante um aumento no nível de felicidade que dura seis
semanas. Portanto, de tempos em tempos, lembre-se de agradecer.
• Faça atos de altruísmo ou bondade. Colabore com alguma
instituição humanitária, ensine algo que você saiba (não interessa se as aulas
são de alfabetização ou de guitarra), saia do seu caminho para ajudar alguém.
• Se tem alguém que foi importante na sua vida, ainda que
num passado remoto, faça-o saber disso, de preferência com uma visita pessoal.
Os cientistas dizem que essa “visita de gratidão” pode valer um mês de
felicidade.
A receita da infelicidade
Se você quer mesmo ser feliz, precisa se convencer de que
nada disso é a solução.
Dinheiro
• Ele só traz felicidade até o momento em que cobre as
necessidades básicas. Depois disso, mais dinheiro não altera o nível de
satisfação. E um foco exagerado em coisas materiais vai esvaziar sua vida de
significado.
Casamento
• Condicionar a felicidade a fatores sobre os quais você não
tem controle não pode dar certo. Além disso, um casamento não tem nada a ver
com um estado perene de alegria. Ele tem altos e baixos como tudo na vida.
Futuro
• “Vou ser feliz quando eu terminar de pagar meu
apartamento.” É importante ter metas, mas achar que a felicidade está no futuro
só adia sua realização. Sem falar que, depois de quitar a dívida, é provável
que você invente outra meta, ainda mais difícil.
Carro novo
• Nossa cultura consumista e a publicidade criam
necessidades novas a cada minuto. Às vezes o carro antigo ainda funciona muito
bem, mas você se convence de que não pode viver sem o modelo maior que foi
lançado esse mês.
Beleza
• Mais um caso de expectativa irreal. Em primeiro lugar,
porque é impossível ter um corpo e um rosto perfeitos. Em segundo, porque nada
disso é garantia de felicidade. Pergunte à Gisele Bündchen se ela não sofre às
vezes.
Status
• Priorizar símbolos de status indica uma preocupação maior
com os outros do que com você mesmo. Uma cobertura de frente para a praia é boa
por causa da vista maravilhosa, não porque vai deixar os amigos morrendo de
inveja.
Felicidade interna bruta
A Holanda é o país mais feliz do mundo. Mas o Brasil está
bem na fita
“A Felicidade Interna Bruta de um país é mais importante do
que seu Produto Interno Bruto”. A frase foi dita nos anos 70 por Jigme Singye
Wangchuck, rei do Butão, um país budista espremido entre a China e a Índia.
Se formos acreditar
em Wangchuck, o índice mais importante que existe é aquele avaliado pela
pesquisa comandada pelo especialista americano Ed Diener. Pessoas de várias
partes do mundo tiveram de avaliar sua própria felicidade, dando notas.
O resultado foi bem
interessante. Primeiro: ficou claro que os países ricos têm níveis altos de
felicidade. Nenhuma nação com renda per capita maior que 20 mil dólares por ano
tirou nota de felicidade abaixo de 8 e todos os que passaram de 9 são ricos.
Mas não são só os
ricos que riem. Nossa América Latina também passou de ano, apesar da pobreza. O
destaque foi a Colômbia – justo ela, assolada pelo tráfico de drogas e pela
guerra civil.
O Brasil revelou-se
menos feliz que Argentina e Uruguai, uma surpresa para quem acredita no
estereótipo carnavalesco. Mas também nos saímos bem.
Felicidade é...
Tirando "amor", não tem palavra mais difícil de
definir. Veja aqui algumas tentativas
... “viver em paz e harmonia.”
Visão budista
... “a atividade da alma dirigida pela virtude.”
Aristóteles, filósofo grego (384–322 a.C.)
... “uma boa saúde e uma memória ruim.”
Ingrid Bergman¸ atriz sueca (1915-1982)
... “breve. Nunca chame um mortal de feliz até ver como ele
baixou à sua tumba.”
Eurípedes, dramaturgo grego (480-406 a.C.)
... “um mistério como a religião. Não deveria nunca ser
racionalizada.”
Gilbert Keith Chesterton, escritor inglês (1874-1936)
... “algo que não alcançaremos neste mundo, mas apenas após
a salvação.”
Visão cristã
... “um estado imaginário, antes atribuído pelos vivos aos
mortos, hoje geralmente atribuído pelos adultos às crianças e pelas crianças
aos adultos.”
Thomas Szasz, psiquiatra húngaro (1920-)
... “um subproduto de alguma outra coisa que a gente está
fazendo.”
Aldous Huxley, escritor inglês (1894-1963)
... “o caminho. Portanto, não existe caminho para a
felicidade.”
Mahatma Gandhi, líder nacionalista indiano (1869-1948)
Felicidade é um truque. Um truque da natureza concebido ao
longo de milhões de anos com uma só finalidade: enganar você. A lógica é a
seguinte: quando fazemos algo que aumenta nossas chances de sobreviver ou de
procriar, nos sentimos muito bem.
Tão bem que vamos
querer repetir a experiência muitas e muitas vezes. E essa nossa perseguição
incessante de coisas que nos deixem felizes acaba aumentando as chances de
transmitirmos nossos genes.
“As leis que governam
a felicidade não foram desenhadas para nosso bem-estar psicológico, mas para
aumentar as chances de sobrevivência dos nossos genes a longo prazo”, escreveu
o escritor e psicólogo americano Robert Wright, num artigo para a revista
americana Time.
A busca da felicidade é o combustível que move a humanidade
– é ela que nos força a estudar, trabalhar, ter fé, construir casas, realizar
coisas, juntar dinheiro, gastar dinheiro, fazer amigos, brigar, casar, separar,
ter filhos e depois protegê-los.
Ela nos convence de que cada uma dessas conquistas é a coisa
mais importante do mundo e nos dá disposição para lutar por elas. Mas tudo isso
é ilusão. A cada vitória surge uma nova necessidade. Felicidade é uma cenoura
pendurada numa vara de pescar amarrada no nosso corpo.
Às vezes, com muito
esforço, conseguimos dar uma mordidinha. Mas a cenoura continua lá adiante,
apetitosa, nos empurrando para a frente. Felicidade é um truque.
E temos levado esse truque muito a sério. Vivemos uma época
em que ser feliz é uma obrigação – as pessoas tristes são indesejadas, vistas
como fracassadas completas. A doença do momento é a depressão.
“A depressão é o mal
de uma sociedade que decidiu ser feliz a todo preço”, afirma o escritor francês
Pascal Bruckner, autor do livro A Euforia Perpétua. Muitos de nós estão fazendo
força demais para demonstrar felicidade aos outros – e sofrendo por dentro por
causa disso. Felicidade está virando um peso: uma fonte terrível de ansiedade.
Esse assunto sempre foi desprezado pelos cientistas. Mas, na
última década, um número cada vez maior deles, alguns influenciados pelas
ideias de religiosos e filósofos, tem se esforçado para decifrar os segredos da
felicidade.
A idéia é finalmente
desmascarar esse truque da natureza. Entender o que nos torna mais ou menos
felizes e qual é a forma ideal de lidar com a ansiedade que essa busca infinita
causa. Veja nas próximas páginas o que eles já descobriram.
Três caminhos
Um dos motivos pelos quais a felicidade é tão difícil de
alcançar é que nem sabemos bem o que ela é (veja algumas tentativas de defini-la
no quadro da página abaixo). Daí a importância das pesquisas do psicólogo
americano Martin Seligman, da Universidade da Pensilvânia. Seligman concluiu
que felicidade é na verdade a soma de três coisas diferentes: prazer,
engajamento e significado.
Prazer você sabe o que é. Trata-se daquela sensação que
costuma tomar nossos corpos quando dançamos uma música boa, ouvimos uma piada
engraçada, conversamos com um bom amigo, fazemos sexo ou comemos chocolate.
Um jeito fácil de reconhecer se alguém está tendo prazer é
procurar em seu rosto por um sorriso e por olhos brilhantes. Já engajamento é a
profundidade de envolvimento entre a pessoa e sua vida. Um sujeito engajado é
aquele que está absorvido pelo que faz, que participa ativamente da vida. E,
finalmente, significado é a sensação de que nossa vida faz parte de algo maior.
A vantagem de dividir a felicidade em três é que assim fica
mais fácil definirmos nossos objetivos. “Buscar a felicidade” é uma meta meio
vaga, fica difícil até de saber por onde começar. Mas, se você se conscientizar
de que basta juntar essas três coisas – prazer, engajamento e significado –
para a felicidade vir de brinde, a tarefa torna-se menos penosa.
Seligman acha que um dos maiores erros das sociedades
ocidentais contemporâneas é concentrar a busca da felicidade em apenas um dos
três pilares, esquecendo os outros.
E geralmente
escolhemos justo o mais fraquinho deles: o prazer. “Engajamento e significado
são muito mais importantes”, disse ele numa entrevista à Time. Como então alcançá-los?
(Veja algumas dicas práticas para ser feliz, no quadro à direita.)
Comecemos pelo engajamento. Algumas pessoas são capazes de
se engajar em tudo: entram de cabeça nos romances, doam-se ao trabalho, dão
tudo de si a todo momento.
Isso é raro e nem
sempre é bom (inclusive porque gente engajada demais tende a negligenciar
outros aspectos da vida, em especial o prazer). Ninguém precisa ir tão longe,
mas o esforço de estar atento ao mundo, participando da vida, vale a pena.
Mihaly Csikszentmihalyi (pronuncie “txicsentmirrái”),
pesquisador da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, estuda um fenômeno
cerebral chamado “fluxo”, que ocorre quando o engajamento numa atividade
torna-se tão intenso que dá aquela sensação boa de estar completamente absorto,
a ponto de esquecer do mundo e perder a noção do tempo.
Ou seja, é um estado
de alegria quase perfeita. Esse fenômeno acontece com monges em estado de
meditação, mas também em situações muito mais comuns, como ao tocar um
instrumento, andar de bicicleta ou até mesmo ao consertar a estante da casa.
Um outro pesquisador, o americano Richard Davidson, da
Universidade de Wisconsin, observou em laboratório que as pessoas em estado de
fluxo ativam uma região do cérebro chamada córtex pré-frontal esquerdo, o que
pode ter uma série de efeitos no organismo, inclusive um melhor funcionamento
do sistema imunológico.
Ao longo de um estudo
realizado na Holanda, pessoas que entraram em fluxo tiveram seu risco de morte
reduzido em 50%, por reagirem melhor a doenças.
E como se entra no tal fluxo? Csikszentmihalyi afirma que o
segredo é buscar atividades nas quais se possa usar todo o seu talento. Tem de
ser um desafio não muito fácil a ponto de ser entediante, nem tão difícil que
se torne frustrante. Procurar experiências desse tipo é recompensador e traz
níveis bem altos de felicidade.
Claro que
infelizmente nem todo mundo tem a sorte de encontrar desafios assim no
trabalho. Nesse caso, um hobby pode ajudar na busca por engajamento e por
momentos de fluxo – pode tanto ser uma atividade manual ou intelectual quanto
um esporte.
Quanto ao terceiro pilar da felicidade, o significado, o
jeito tradicional de conquistá-lo é via religião. Há milênios, a humanidade
encontra alento na crença de que cada um de nós faz parte de uma ordem maior.
Pesquisas mostram que
as pessoas religiosas consideram-se, na média, mais felizes que as
não-religiosas – elas também têm menos depressão, menos ansiedade e suicidam-se
menos.
A crença de que Deus está nos observando, nas palavras do
psicólogo e estudioso da religião Michael McCullough, da Universidade de Miami,
é uma espécie de “equivalente em grande escala do pensamento ‘se eu não
conseguir pagar o aluguel, meu pai vai ajudar’”. Ou seja, é um conforto, uma
garantia de que, no final, as injustiças serão corrigidas e nossos esforços,
reconhecidos.
Mas a religião não é a única forma de dar significado à
vida. Um truque eficaz para ficar mais feliz é fazer o bem para os outros –
visitar um orfanato, ajudar uma criança a fazer a lição de casa, dar um
presente útil.
E isso não é conversa
mole. Seligman mediu em laboratório os efeitos do altruísmo e percebeu que um
único ato de bondade pode melhorar efetivamente os níveis de felicidade de uma
pessoa por até dois meses.
Cinco atos de bondade por semana turbinaram sensivelmente o
astral dos cobaias – e, quando todos os cinco foram realizados num mesmo dia, o
benefício foi ainda maior.
Também se alcança significado construindo algo que pode
sobreviver a você. O exemplo clássico é criar filhos. Uma outra dica é
acreditar que sua vida é importante para alguma grande causa: a história, a
ciência, a justiça social, a democracia, a liberdade, o progresso, a natureza.
Ou seja, é útil crer em algo, mesmo que não seja em Deus.
Para terminar, há uma regra da qual especialista nenhum
discorda: ter amigos (e nem precisam ser muitos) ajuda a ser feliz. Amigos
contam pontos nos três critérios: trazem, ao mesmo tempo, prazer, engajamento e
significado para nossas vidas.
Ser infeliz é preciso
Ok, já temos a receita da felicidade. Basta juntar prazer,
engajamento e significado e nossa vida se resolve para sempre? Ah, se fosse
assim tão simples.
A felicidade, como não cansam de repetir os poetas e os
chatos, é breve. Ainda bem. Felicidade, por definição, é um estado no qual não
temos vontade de mudar nada. Ou seja, se passássemos tempo demais assim, nossas
vidas estacionariam.
A busca da felicidade
é o que nos empurra para a frente – se agarramos a cenoura, paramos de correr e
a brincadeira perde completamente a graça. Portanto, um pouco de ansiedade, de
insatisfação, é perfeitamente saudável.
“Felicidade é projetada para evaporar”, escreveu Robert
Wright. E, segundo ele, há uma razão evolutiva para isso também: “se a alegria
que vem após o sexo não acabasse nunca, então os animais copulariam apenas uma
vez na vida”.
Mora aí um dos
grandes problemas atuais. Muita gente acredita que é possível viver uma
existência só de altos, sem nenhum ponto baixo, sem tristeza, sem sofrimento. E
alguns estão dispostos a conseguir isso sem esforço algum, só à custa de
antidepressivos.
Isso é conversa de cientista, mas alguns religiosos, em
especial os budistas, já afirmam algo parecido há muito tempo.
Um de seus preceitos
básicos é o de que “a vida é sofrimento”. Coisa chata, né? Talvez, mas ter
consciência de que o sofrimento é inevitável pode ajudar a trazer felicidade, e
certamente diminui a ansiedade.
O conselho do dalai-lama é que, quando as coisas estiverem
mal, em vez de se entregar à infelicidade ou tentar apenas minimizar os
sintomas, você respire fundo e tente descobrir o porquê da situação.
Segundo ele, grande parte da dor é criada por nós mesmos,
pela nossa inabilidade de lidar com a tristeza e pela sensação de que somos
obrigados a ser sempre felizes.
Ao encarar o
sofrimento de frente e identificar as suas causas reais, você estará dando um
passo na direção do autoconhecimento, o que vai lhe permitir entender quais
seus objetivos na vida, quais seus valores.
Para usar a
terminologia de Seligman, esse autoconhecimento dará a você mais clareza sobre
que tipo de atividades lhe traz prazer, engajamento e significado.
Ou seja, são esses
momentos ruins que criarão condições para você correr atrás da sua própria
realização – individual, pessoal e intransferível.
Cada um é cada um
É aí que está o pulo-do-gato. Não existe uma fórmula da
felicidade que funcione com todo mundo – é justamente nisso que os livros de
autoajuda costumam falhar.
Cada pessoa é
diferente e reage à vida de modo diferente. Foi essa a conclusão do estudo
realizado em 1996 pelo pesquisador David Lykken, da Universidade de Minnesota.
Ele comparou dados sobre 4 000 pares de gêmeos idênticos e
percebeu que, na maioria dos casos, quando um tem tendência a ver o mundo de
modo otimista, o outro tem também – e quando um é pessimista o outro é igual.
Ou seja, existe um
forte componente genético na nossa tendência a ser feliz. Não que isso seja uma
grande surpresa. Qualquer pai ou mãe sabe que algumas crianças nascem com
vocação para o sorriso, enquanto outras são simplesmente muito mais difíceis de
agradar.
Nas últimas décadas, apareceram muitas evidências de que nós
tendemos a manter um “nível de felicidade” constante ao longo de nossas vidas –
e nem mesmo grandes acontecimentos parecem capazes de alterar bruscamente esse
nível.
Um exemplo disso é a
pesquisa conduzida pelo psicólogo Richard Lucas, da Universidade do Estado de
Michigan, Estados Unidos. Lucas passou 15 anos entrevistando solteiros e
casados na Alemanha e pedindo que eles dessem notas de 0 a 10 para seu estado
de felicidade. Os solteiros tinham média 7,28.
No momento em que
eles casavam, o valor aumentava muito: para perto de 8,5. Mas dois anos depois
a média já era de exatamente 7,28 outra vez. Ou seja, a longo prazo, o
casamento parece não mudar – para melhor ou para pior – o nível de felicidade.
O mesmo vale para outros acontecimentos radicalmente
transformadores – para o bem ou para o mal. Um estudo com ganhadores da loteria
realizado em 1978 mostrou que esses felizardos têm picos de felicidade logo
após o prêmio, mas tendem a voltar aos níveis anteriores alguns meses depois.
Algo equivalente
parece acontecer com pessoas que ficam paraplégicas em acidentes. Elas passam
por um período de infelicidade, mas dois meses depois recuperam níveis quase
tão altos quanto os anteriores ao acidente.
Esse acúmulo de dados levou alguns especialistas a afirmarem
que a felicidade é algo imutável. Oito anos atrás, o pesquisador Lykken criou
polêmica ao afirmar publicamente que “parece que tentar se tornar mais feliz é
tão fútil quanto tentar se tornar mais alto”.
Hoje até ele próprio
reconhece que essa afirmação foi, no mínimo, exagerada. Parece que uma analogia
melhor para a felicidade é compará-la com o peso.
Cada um de nós tem um
biotipo diferente – uma tendência para ser mais ou menos gordo. Mas é claro que
os nossos hábitos e a nossa postura têm uma grande influência sobre o número
que aparece na balança.
É a mesma coisa com a
felicidade: temos uma tendência natural para um certo nível. Mas fazer regime
funciona.
Uma questão de desejo
Um exemplo do quanto podemos alterar nossa predisposição
genética para a felicidade é a forma como lidamos com nossos desejos.
Existem duas maneiras
de alcançar a felicidade: possuindo mais ou desejando menos. Se a felicidade é
a cenoura, a vara na qual ela está pendurada é o que chamamos de desejo.
E estamos fazendo
varas cada vez mais compridas.
Veja o caso dos países ricos. “Nos Estados Unidos e na
Europa, há uma sensação de desapontamento, pois se está percebendo que existe
um limite para a satisfação que a sociedade e os bens materiais trazem”, diz o
economista e filósofo Eduardo Giannetti, autor do ótimo livro Felicidade.
Nos Estados Unidos, desde a Segunda Guerra Mundial, todos os
indicadores econômicos e sociais melhoraram sem parar. A renda triplicou, o
tamanho das casas dobrou e o acesso aos bens materiais cresceu tanto, que hoje
há mais carros nas garagens do que habitantes no país.
Ainda assim, o índice
nacional de felicidade não cresceu um milímetro sequer. O Centro de Pesquisas
de Opinião Nacional dos Estados Unidos entrevista periodicamente os americanos
desde os anos 50 – e o resultado é invariavelmente o mesmo (um terço deles se
considera “muito feliz”).
Há uma razão para isso: os americanos querem cada vez mais.
Seus desejos não param de crescer. Ou seja, a cenoura está cada vez mais
apetitosa, mas também mais distante. Demandas crescentes são a condição
essencial para manter a economia funcionando.
A lógica do capitalismo
é criar necessidades, para então satisfazê-las – não por acaso, esse país de
insatisfeitos é o mais rico do mundo. Precisamos das coisas a partir do momento
em que elas estão disponíveis e isso vale tanto para produtos quando para ideias.
Quando vemos pessoas
lindas, maquiadas e malhadas nas capas das revistas, e aparelhos de som
inacreditáveis nos anúncios, fica difícil nos satisfazer com nosso visual comum
e com o walkman velho mas honesto.
Acontece que a
felicidade não está diretamente ligada aos bens materiais. Ed Diener, da
Universidade de Illinois, estudioso do assunto há 25 anos, avaliou o nível de
felicidade das 400 pessoas mais ricas do mundo segundo a revista Forbes, e
concluiu que elas estão rigorosamente empatadas com os pastores maasai da
África.
Para complicar, temos cada vez mais opções. Na época em que
a prateleira da farmácia abrigava apenas xampu para cabelos secos, normais ou
oleosos, era fácil escolher um e ir para casa tranquilo.
Mas, quando na sua frente se enfileiram xampus de todas as
procedências e preços, para cabelos ondulados, escuros, danificados, mistos,
com pontas duplas, tingidos ou fracos, você não tem mais tanta segurança de que
sua escolha foi a melhor.
O mesmo acontece na hora de comprar um carro, creme dental
ou comida congelada. Ou no momento de escolher um namorado ou uma profissão.
“Muita gente fica
simplesmente paralisada com tantas opções”, diz o psicólogo americano Barry
Schwartz em seu livro, The Paradox of Choice (“O Paradoxo da Escolha”, não
lançado no Brasil). Está aí uma fonte de frustração e ansiedade.
Em 2000, Sheena Iyengar e Mark Lepper, das Universidades de
Columbia e Stanford, montaram em uma loja dois estandes com amostras de geleia,
um com 24 opções de sabor e outro com apenas seis.
O número de clientes
que comprou o produto foi dez vezes maior no estande menos variado, ainda que o
outro tenha atraído 50% mais gente. Por que isso acontece? Schwartz sugere que
nessas situações as pessoas avaliam intuitivamente os “custos de oportunidade”:
uma escolha implica
abrir mão de todas as outras opções. Quando há centenas de possibilidades,
escolher uma só significa “perder” muito mais. E, no mundo de hoje, em que cada
um tem acesso ao mundo inteiro pela internet e quase não há limites para os nossos
desejos, parece inevitável ficar ansioso – e infeliz – com tudo isso.
Pesquisando o assunto, o psicólogo encontrou padrões de
comportamento que permitem dividir as pessoas em dois grupos: as que procuram
fazer escolhas apenas satisfatórias, sem tentar alcançar a perfeição, e as que
não sossegam até que encontrem “a melhor opção de todas”.
As pessoas do segundo
grupo costumam fazer escolhas melhores, é claro. Mas as do primeiro ficam mais
felizes com suas decisões. “A solução é diminuir o número de opções ou melhorar
nossa maneira de fazer escolhas”, diz Schwartz.
Então tá. Mas será que sabemos fazer as melhores escolhas
para nossa vida? Segundo os pesquisadores Daniel Gilbert, Tim Wilson, George
Loewenstein e Daniel Kahneman, a resposta é não.
Decisões são tomadas
tendo como base nossa previsão de como cada opção vai afetar nossas vidas.
Porém, segundo eles, temos uma dificuldade enorme para avaliar o quanto um
acontecimento vai nos deixar felizes ou infelizes.
Nós superestimamos a intensidade e a duração das nossas
reações emocionais, ao mesmo tempo que subestimamos nossa capacidade de
adaptação.
Lembra da história
dos ganhadores da loteria e acidentados paraplégicos que logo voltam ao nível
normal de felicidade? Pois então: somos capazes de nos acostumar com quase
tudo.
Postado por dharmaDhannya
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