Saúde e Bem Estar
Inimigo secreto
Pode acontecer de um
distúrbio na tireoide passar despercebido durante um tempo. Mas, cedo ou tarde,
uma pane nessa pequena e poderosa glândula mostra seus efeitos nem um pouco
agradáveis
Chris Biltoveni
À primeira vista, e
para muitas pessoas, ter uma disfunção na tireoide não parece um problemão.
Tremendo engano – e eu que o diga. Há alguns anos, senti que o ponteiro da
balança começou a disparar, apesar de eu sempre ter controlado a alimentação e
malhado bastante.
Achei que pudesse ser apenas uma fase: talvez eu não
estivesse me empenhando direito na ginástica ou andava abusando do chocolate...
Mas, de repente, o incômodo ganhou proporções maiores: comecei a sentir um
tremendo desânimo, passava o dia inteiro com sono, lenta e deprimida.
Ao procurar um médico,
o diagnóstico: hipotireoidismo. Desde então, tomo medicamento para controlar o
problema, mas basta um descuido com o remédio que já começo a ficar cansada.
“É
uma doença que precisa ser tratada com seriedade. A glândula tireoide é
essencial para o comando do metabolismo, atuando em praticamente todos os
órgãos e tecidos”, diz Geraldo Medeiros, presidente do Instituto da Tireoide,
em São Paulo (SP).
Hipo ou hiper?
Quando a glândula está
desregulada e fabrica os hormônios em quantidade insuficiente, ocorre o
hipotireoidismo. “O corpo passa a funcionar de maneira mais lenta e o
metabolismo desacelera.
Então, aparecem cansaço, fraqueza, desânimo e aumento
de peso”, revela o endocrinologista Tércio Rocha, especialista em emagrecimento
do Rio de Janeiro (RJ). Um dos principais motivos dessa alteração é a
tireoidite de Hashimoto, uma doença autoimune que gera a destruição da
glândula.
“O próprio organismo começa a produzir anticorpos que atacam a
tireoide, destruindo-a”, fala a endocrinologista Maria Edna de Melo, da ABESO
(Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica). Os
especialistas apontam principalmente a herança genética como causa para o
aparecimento do problema.
Se a glândula produz os
hormônios em excesso, acontece o contrário: tudo no organismo funciona rápido
demais. É o chamado hipertireoidismo, que provoca irritabilidade, aceleração
dos batimentos cardíacos, insônia e perda de peso.
“Aqui, a causa mais comum é
a doença de Graves, em que anticorpos estimulam a produção excessiva dos
hormônios”, diz Maria Edna. “É nesses casos que aparece o bócio difuso, um
aumento generalizado da glândula”, relata a endocrinologista Laura Ward,
presidente do Departamento de Tireoide da Sociedade Brasileira de
Endocrinologia e Metabologia.
Mas outros fatores podem levar ao distúrbio. “Às
vezes, algumas células se agrupam em um nódulo e funcionam de forma autônoma,
gerando a superprodução dos hormônios”, completa Maria Edna.
As causas para o
aumento no número de problemas na tireóide ainda são desconhecidas, mas o maior
aparecimento da doença no sexo feminino – ocorrem de cinco a oito vezes mais
frequentemente – dá algumas pistas.
“Não existe comprovação, mas o uso de
hormônios sexuais, número de gravidezes e reposição hormonal são possíveis
causadores”, diz Laura. E tem o estresse, o vilão mais claro: ele
comprovadamente desencadeia doenças autoimunes. Os casos de hipertireoidismo
são bem menos comuns – entre as mulheres, apenas cerca de 3% têm a doença.
De olho no diagnóstico
Para acusar uma
tireoide de lenta ou agitada é preciso ter provas. A primeira delas é colhida
no sangue: uma dosagem dos hormônios TSH e T4 tem o objetivo de avaliar a
função glandular. Outra medida importante é fazer o exame clínico.
Se o médico
suspeitar da existência de nódulos, pede um ultrassom para apurar. Foi o que
aconteceu com a funcionária pública Denise Garcia, 42 anos, de São Paulo. “O
exame de sangue não acusou nada, mas fiz o ultrassom e foram detectados
nódulos”, lembra.
Denise realizou uma punção e descobriu que estava com câncer.
“Fiz a cirurgia de retirada da tireóide em junho de 2009. Hoje estou curada da
doença, mas sofro com os efeitos colaterais. É a fase 2 do problema. O corpo
precisa se adaptar ao hormônio sintético. Enquanto isso não ocorre, vivo em
crise de energia. Tem dias que não funciono.”
De acordo com Flávio
Hojaij, diretor científico da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e
Pescoço, o risco de um nódulo ser maligno é pequeno, mas, existe sim:
“Se eu
fizer ultrassom de tireoide em 100 pessoas, 60 vão apresentar alguma alteração
na textura da glândula. Isso não quer dizer que vão desenvolver câncer.” Ele
ressalta a importância de uma investigação mais profunda se o nódulo for sólido
ou muito grande.
“Em caso de malignidade, o tratamento cirúrgico é bastante
eficaz e o risco de sequelas é pequeno”, garante. Entre as possíveis
conseqüências estão a mudança da voz, pelo risco de o cirurgião manusear os
nervos da laringe durante a operação, e a alteração nos níveis de cálcio no
sangue, por conta da manipulação das glândulas paratireoides, que ficam ao lado
da tireoide.
Em busca do equilíbrio
Quanto antes for
realizado o diagnóstico, melhor – mesmo porque o tratamento, às vezes, não
surte efeito de uma hora para outra. Um dos motivos está na dificuldade de
encontrar a dose ideal do hormônio a ser reposto. “Descobri faz dois anos que
tinha hipotireoidismo, mas só há quatro meses consegui estabilizar o quadro.
Comecei com um comprimido de 50 mcg, passei para 75, em seguida 88, depois
diminuí... Essa oscilação é terrível, porque quando você pensa que está bem,
tem que mudar a dose do medicamento de novo”, conta a economista Simone Silva,
31 anos, do Rio de Janeiro.
Um estudo feito por pesquisadores britânicos
constatou que cerca de 45% dos portadores de hipotireoidismo não tomam a dose
ideal do remédio, recebendo hormônio em excesso ou em dose insuficiente.
“Aprendi que é preciso ficar constantemente de olho e fazer exames de tempos em
tempos para manter a doença sob controle”, admite Simone.
Fazer uma dosagem nos
hormônios regularmente é mesmo imprescindível para evitar que o distúrbio leve
a problemas mais sérios. Se você não se tratar corretamente, o quadro clínico vai
piorando e as conseqüências podem ser graves.
No caso de hipotireoidismo,
costumam surgir complicações como aumento de colesterol, hipertensão arterial,
insuficiência cardíaca e até envelhecimento precoce. Já quem tem a tireoide
acelerada pode apresentar arritmia cardíaca, palpitações e falta de ar.
Tratamento eficaz
No hipotireoidismo, é
preciso repor o hormônio que a glândula não produz corretamente por meio de um
medicamento chamado levotiroxina, uma versão sintética do hormônio T4.
“Dentro
do organismo, por meio da ação de enzimas, ele é transformado em T3 para agir
nas células de todo o corpo, acelerando sua atividade”, declara Tércio Rocha. A
maior parte dos especialistas recomenda que você tome um comprimido, cuja dose
varia de acordo com a necessidade da substância no seu organismo, logo pela
manhã, em jejum.
Mas, segundo Geraldo Medeiros, a medicação pode ser eficiente
à noite, antes de dormir, especialmente quando a paciente apresentar variações
constantes na dosagem de TSH: “Às vezes, você acerta a dose de T4, mas a de TSH
oscila muito. Então, como o TSH é produzido pela hipófise no período noturno,
ingerir o remédio nesse horário é uma forma de inibir melhor a liberação desse
hormônio”.
Por outro lado, o
hipertireoidismo é contra-atacado com uma terapia à base de iodo radioativo,
que destrói a tireoide, ou com drogas que bloqueiam a liberação desmedida de
hormônios. “O iodo vale mais a pena em termo de custo-benefício, mas o remédio
funciona bem e, em alguns casos, é a primeira indicação”, aponta Laura Ward.
A
jornalista Cristiana Barreto, 41 anos, optou pelo uso de medicamento para
controlar o problema. “Há 17 anos, descobri um nódulo na tireoide que estava
produzindo hormônios além da conta. Tinha taquicardia e passava o dia inteiro
irritada, como se estivesse o tempo todo na TPM. Fiz cirurgia para retirada e,
desde então, tomo remédio diariamente e minha vida voltou ao normal”, diz.
É
isso mesmo: apesar de os tratamentos exigirem paciência, a boa notícia é que
eles permitem que a tireoide entre na linha. “Com a dose correta do
medicamento, tudo fica bem”, tranquiliza Geraldo Medeiros. Ou seja: uma vez sob
controle, a glândula deixa de causar transtornos e embarca o seu corpo inteiro
rumo ao equilíbrio.
Autoexame é fundamental
O mesmo método simples
que a gente costuma usar para prevenir o câncer de mama vai ajudá-la a detectar
a existência de nódulos na tireoide. Você só precisa de um copo de água, um
espelho e um pouco de atenção. Confira!
*De frente para o
espelho, localize com os dedos onde fica a tireoide – logo abaixo do
pomo-de-adão, saliência que conhecemos como gogó.
*Beba um gole de água.
Enquanto você engole, a glândula vai subir e descer, movendo-se para cima e
para baixo.
*Perceba o movimento
com os dedos e observe se dá para notar algum inchaço ou caroço. Se sentir que
há qualquer alteração, procure um endocrinologista.Anamaria Braga
Controle da Tireoide.
REvista Anamaria.
Pequenina e poderosa, a tireoide é uma glândula endócrina que espelha bem a máxima de que tamanho não é documento. Com aproximadamente 25 gramas, ela possui uma forma bastante semelhante a uma borboleta e tem responsabilidades imensas, como a de regular a função de importantes órgãos, a exemplo do coração, cérebro, fígado e rins, através da produção dos hormônios tri-iodotironina (T3) e tiroxina (T4).
São eles que atuam como o maestro de uma grande orquestra, pois possuem a missão de harmonizar o funcionamento do organismo. “Os hormônios produzidos pela tireoide são um combustível que deve estar disponível na quantidade certa em nosso corpo: nem demais e nem de menos”, diz o endocrinologista Gustavo Caldas, professor do Programa de Pós-Graduação da Unidade de Endocrinologia e Diabetes do Hospital Agamenon Magalhães.
O depoimento do médico remete às condições em que a glândula funciona de forma acelerada ou lentamente, o que leva o organismo a um tremendo descompasso. Quando o trabalho dela é realizado de maneira bastante ligeirinha, entra em cena o hipertireoidismo, que pode ser caracterizado por vários sinais, como batimentos cardíacos acelerados, intestino solto, agitação e insônia.
E se a tireoide inventa de ficar preguiçosa, os sintomas são justamente o oposto: diminuição da memória, cansaço excessivo, dores musculares e articulares, sonolência e até uma tristeza que pode ser confundida com depressão.
Foi numa consulta, há sete anos, com um endocrinologista que a publicitária Karol Nogueira, 30 anos, descobriu ocasionalmente o motivo de um misto de sintomas que a incomodava. Pele seca, unhas fracas e quebradiças, queda de cabelo e tristeza tinham como causa o hipotireoidismo, que se manifesta pela diminuição do hormônio T4 e pelo aumento do TSH – condição detectada por um exame de sangue. Interessante é que Karol não foi ao médico por conta desses efeitos indesejáveis, e sim porque não estava satisfeita com o peso.
“No começo, tomei um susto por ser informada que tomaria por toda a vida um comprimido em jejum para repor o hormônio. Mas, quando vi os sintomas irem embora, principalmente o inchaço, comecei a me acostumar”, acrescenta Karol, que se sentiu estimulada a adotar um estilo de vida saudável desde que começou o tratamento. “Ganhei disposição de sobra para caminhar, correr e fazer exercício na academia.”
O inchaço e demais incômodos relatados por Karol são fruto da desaceleração generalizada do metabolismo corporal que ocorre no hipotireoidismo. Nesse sentido, vale um alerta: essa disfunção da glândula pode até ser responsável por uma leve subida do ponteiro da balança, mas não é responsável isoladamente pelo sobrepeso e pela obesidade.
"O ACESSO A APARELHOS DE ULTRASSONOGRAFIA CERVICAL DE ALTA RESOLUÇÃO TEM LEVADO A UMA MAIOR DETECÇÃO DE ALGUMAS DISFUNÇÕES DA TIREOIDE", DIZ FERNANDO ALMEIDA
Curioso é que se tornou cada vez mais comum escutar histórias de pessoas que convivem com alguma disfunção na glândula. Essas anormalidades abarcam não apenas o hipo e o hipertireoidismo, como também a tireoidite de Hashimoto (doença autoimune considerada a principal causa de bócio e hipotireoidismo), câncer de tireoide e demais nódulos na glândula sem sinais de malignidade.
“O acesso a aparelhos de ultrassonografia cervical de alta resolução tem levado a uma maior detecção de algumas disfunções. Antes do advento desse método de diagnóstico, os médicos tinham que se confiar no tato e apalpar a glândula para investigar possíveis problemas”, informa o endocrinologista Fernando Almeida, do Instituto de Endocrinologia do Recife.
Nesse contexto, é importante abrir um parêntese: a comunidade médica continua a valorizar a palpação e a solicitar exames laboratoriais que se somam aos achados da ultrassonografia. “Interessante é que toda essa investigação não se limita a nós, endocrinologistas. Muitos ginecologistas já solicitam essa bateria de testes e, diante de alguma alteração, encaminham para a gente”, acrescenta Almeida.
Toda essa pesquisa criteriosa ajuda muito a identificar precocemente as desordens da glândula. E esse cenário é digno de crédito. Afinal, diagnosticar precocemente os nódulos e os altos e baixos dos hormônios é fundamental para devolver o bem-estar dos pacientes e aniquilar problemas que podem ser nefastos, como o câncer.
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