Psicologia quântica do Afeto - 2
Na
filosofia, a mesma batalha se reflete na tensão entre os filósofos que
argumentam que o indivíduo é tudo e o mundo a seu redor pouco importante
(talvez até inexistente) e outros filósofos que procuram dizer que o indivíduo
é nada, e que seu relacionamento com outras coisas e pessoas é o que
importa.
A
primeira é filosofia do individualismo radical que, se levada a extremos,
torna- se solipsismo. A segunda encontra voz na filosofia de Parfit, no
misticismo oriental e na preocupação de Marx com a "história", a
sociedade e as forças sociais.
Mas
até que ponto essa tensão será real? É uma tensão entre a realidade e a ilusão
entre um ser real e intimidades ilusórias, ou entre um ser ilusório e intimidades
reais -
ou é uma tensão entre duas realidades, entre um ser real que existe como
indivíduo e um "nós" real do qual aquele indivíduo pode fazer parte?
Se
a última alternativa estiver correta, se tanto o "eu" como o
"nós" são reais e importantes, por que nossos filósofos têm tanta
dificuldade em vê-la?
Toda
a argumentação já pesquisada, mostrou-nos que a realidade do "eu" não
é um problema. Do ponto de vista mecânico-quântico, vemos o ser como algo
flutuante e enevoado cujas fronteiras, tanto internas como externas, estão
sempre se movendo e se modificando.
Não obstante, isso não o faz menos real, menos
substancial. O ser não é uma ilusão. Para o senso comum, um estreito
relacionamento entre nós e os outros parece igualmente real, e de fato parece
definir ao menos parcialmente quem e o que somos.
A
maioria de nós já passou por uma experiência como a dos amantes do poema de
Graves, em que a intimidade entre nós e um outro foi tão completa a ponto de
aparentemente apagar qualquer distinção entre os dois.
Esta é uma experiência comum entre mães e seus
bebês, ao menos no sentido de que a mãe sente o bebê como uma extensão de si
mesma, vivenciando ambos como existentes numa esfera de intimidade cujas
fronteiras definem sua identidade comum.
Os psicólogos nos dizem que o bebê sente a
mesma coisa.
Diz-se
que o mesmo tipo de ligação íntima existe entre o psicoterapeuta e seu
paciente, que muitas vezes o terapeuta se vê sentindo sentimentos e pensando
pensamentos que na verdade são de seus pacientes.
Durante
o tempo de cinquenta minutos, os dois parecem partilhar em alguns momentos de
uma identidade comum, parecem ser um corpo e uma mente.
O mecanismo pelo qual isso ocorre é chamado
"identificação projetiva" e é considerado um veículo de suma importância
através do qual o terapeuta pode realmente conhecer em primeira mão os
problemas inconscientes que seu paciente enfrenta.
Durante algum tempo, até tornar-se consciente
deles e de sua origem, ele experimenta os problemas do paciente como próprios.
Como
descreve certo analista junguiano: "A identificação projetiva pode ser
concebida como uma espécie de fusão que envolve a mistura e emaranhamento de
sujeito e objeto, dos mundos interno e externo; envolve o desfazer de
fronteiras".2
Muitos
exemplos desse grau extremo de intimidade ocorrem em nossa vida diária. As
experiências dos amantes de Graves e da mãe com seu bebê são desse tipo.
O mesmo ocorre entre o professor talentoso e
seu aluno, em que não só o conhecimento do professor, mas toda sua pessoa —
entusiasmo, maneirismos, estilo de pensamento — "entram" no aluno e
tornam-se próprios dele.
Da mesma forma, os líderes políticos
talentosos têm um jeito de perceber os desejos e aspirações não expressos de
seus seguidores, e não só expressá-los como se fossem próprios, mas
realmente senti-los como próprios.
Em
todos esses casos, o relacionamento íntimo parece produzir duas pessoas que se
sobrepõem a tal ponto que cada qual abarca o conteúdo interno da outra. Elas
partilham uma identidade.
Quando
a ira une duas pessoas elas vibram em sintonia e se identificam e estão presos
no ódio que aprisiona.
O mecanismo através do qual isto ocorre também
parece relacionar-se muito intimamente ao sentido um pouco menos extremado da
empatia normal que sentimos por todas as pessoas.
Na empatia, sabemos que não somos a outra
pessoa, mas também sabemos qual seria a sensação de ser aquela pessoa, de estar
em seu lugar, tendo seus sentimentos.
A
empatia é uma forma de intimidade que podemos experimentar em relação a pessoas
totalmente desconhecidas, assim como com aquelas que estão muito próximas. E há
outros.
Todos
os dias experimentamos uma pequena e passageira intimidade com outras pessoas —
quando um estranho responde ao nosso cumprimento numa rua do interior, quando
partilhamos
um sorriso com o estranho sentado ao nosso lado, ao vermos uma criança
envergonhar sua mãe soltando algum comentário sobre uma mulher gorda ou um
velho careca —,
momentos
breves nos quais mesmo a companhia de pessoas estranhas toca nosso ser de
alguma forma, invade as fronteiras de nossa individualidade e, ainda que
timidamente, de alguma forma deixa ali suas marcas.
Nunca mais somos exatamente a mesma pessoa,
tampouco o outro.
Muitas
coisas de nossa experiência nos influenciam e nos modificam. Obviamente, a
saúde e o funcionamento de nosso corpo, inclusive nosso cérebro, dependem da
qualidade do alimento que ingerimos e de muitos fatores mutáveis de nosso
ambiente externo.
Da mesma forma, nosso ser, pensamentos e
comportamento são continuamente influenciados pelos pensamentos e
comportamentos dos outros, pelos membros de nossa família, pelos amigos e
colegas.
Somos influenciados pela cultura em geral —
pelos livros que lemos, filmes a que assistimos, música que ouvimos etc. Muito
da imagem que fazemos daquilo que somos depende do contexto geral de nosso ser
e, em grande parte, essas influências não são um mistério. Para explicá-las não
precisamos de uma nova teoria da pessoa.
Mas
a intimidade parece ser diferente. A intimidade não é um relacionamento entre
"mim" e "você" ou entre "mim" e
"aquilo", no qual você ou a coisa (um livro, uma pedra, um
computador) influenciam a mim.
Na
intimidade, parece que "eu" e "você" nos influenciamos mutuamente,
parece que "entramos" um no outro e modificamos um ao outro no
interior, de tal forma que "eu" e "você" nos tornamos
"nós".
Esse "nós" que experimentamos não é
apenas "eu e você", é uma coisa nova em si, uma nova unidade.
Esse
"nós" altera tanto o "eu" quanto o "você" que o
compõem, assumindo uma identidade própria com capacidade própria para
relacionamentos posteriores.
O
"nós" que parece surgir no relacionamento íntimo é o Eu — Você sobre
o qual escreve Martin Buber em sua distinção entre nosso relacionamento com as
coisas e com as pessoas.
Com as coisas, diz ele, temos um
relacionamento Eu—Isto. Isto poderá influenciar a mim, mas eu
não influencio isto.
O
mundo [das coisas] não participa da minha experiência [de contato com ele]. Ele
permite ser experimentado, mas não toma conhecimento da questão.
Pois ele não afeta a experiência e a
experiência não o afeta.3
Mas
"quando se diz você, aquele que fala (...) se coloca na
relação".4 No Eu— Você, eu e você nos tornamos "nós".
Pelo
fato de todos termos algum tipo de relacionamento pessoal e a maioria de nós
ter tido a sorte de experimentar algum tipo de intimidade em nossas vidas, a
existência de um "nós" é uma verdade vivida para nós.
Os
pais devem ficar alerta com os grupos,
com as comunidades que os adolescentes
participam, o jovem está “construindo” sua identidade e a influência do grupo
pode ser determinante para o seu caráter, para a sua vida, para o seu futuro.
Mas terá ela algum fundamento factual?
Existirá realmente tal coisa como a intimidade, ou será ela apenas uma ilusão a
que se apega o ser em isolamento?
Ela
nos parece bastante real, mas, ao procurarmos compreendê-la, expressá-la,
explicá-la e fazer com que ela integre o aparato conceituai por meio do qual
estruturamos nosso mundo, nós nos deparamos com um problema.
Como dois indivíduos conseguem se
encontrar de tal forma que ambos são modificados internamente por esse encontro
e que o próprio encontro adquire uma identidade?
Qual é a base física desse
"encontro", desse novo "nós" do Eu—Você de Buber?
Em
qualquer abordagem clássica à filosofia e à psicologia da pessoa essa questão
permanece sem resposta e, portanto, fica muito difícil, quase-impossível,
explicar como podem existir os relacionamentos íntimos que obviamente existem à
luz do senso comum.
Na
filosofia cartesiana, que tão profundamente influenciou a corrente
individualista do pensamento moderno, sobre o ser e seus relacionamentos, não
há relações pessoais íntimas.
Tudo
no pensamento de Descartes acontece do ponto de vista da primeira pessoa do
singular do cogito isolado, o "eu" que pensa e que não é nada
além de seu pensar.
Qualquer
relacionamento que esse cogito possa ter com qualquer coisa ou pessoa é
algo indireto que ele tem pela mediação da matéria newtoniana ou da mente de
Deus. "Eu" e "você" jamais se encontram.
O
isolamento cartesiano foi reforçado pela física de Newton, cujo conceito de
matéria, como certo número de bolas de bilhar distintas e indivisíveis,
complementou, por sua vez, as mentes separadas e indivisíveis de Descartes.
A noção de relacionamento como um conjunto de
influências externas operadas entre estranhos tornou-se paradigma para
todo relacionamento.
Bolas
de bilhar não se "encontram", não entram uma dentro da outra
alterando-se mutuamente as qualidades internas. Não têm como fazê-lo, pois cada
uma é sempre e somente ela mesma, totalmente impermeável a qualquer influência
externa.
Como
as mentes de Descartes, elas se inter-relacionam apenas indiretamente, por meio
de forças externas que fazem com que, de vez em quando, se atraiam, se rejeitem
ou se choquem.
Durante a colisão sofrem um impacto e podem
experimentar uma mudança de posição ou de momentum, mas permanecem as
mesmas, antes, durante e depois da colisão.
Seu relacionamento durante a colisão, a
atração ou a repulsão é o que Sartre chamaria de uma "verdade
contingente".
De
fato, todo o paradigma cartesiano-newtoniano de indivíduos isolados, tendo
apenas relacionamentos externos, contingentes, está no fundo de todo o
pensamento existencialista sobre os relacionamentos interpessoais.
Em
O Ser e o Tempo, Heidegger nos diz que o Dasein (ser humano) não
pode ter envolvimentos. "Quando Dasein está absorvido no mundo de
seu interesse — e ao mesmo tempo em seu Ser-junto diante dos Outros — ele não é
ele mesmo."5
Da mesma forma, Sartre, que se vê como
operando a revolução cartesiana até suas últimas consequências, argumenta em O
Ser e o Nada que o ser de outros é um feto de nossa existência, mas não um
feto essencial. É apenas o que ele chama de "necessidade
factual".
O
Ser-para-os-outros não é uma estrutura ontológica do Para-si-mesmo. Não podemos
pensar em obter um ser-para-os-outros a partir de um ser-para-si-mesmo, como se
obteria uma consequência a partir de um princípio.6
Nosso
relacionamento com os outros é simplesmente algo que acontece, como as moscas
que pousam em nosso nariz. O outro na verdade não nos "atinge". Se
pensamos que o outro nos atinge, estamos "com uma visão errônea".
A
psicanálise freudiana, amplamente influenciada por Descartes e Newton e, por
sua vez, tão responsável pelo modo como muitas pessoas comuns se enxergam,
tampouco fornece uma estrutura conceitual para os relacionamentos interpessoais
e, na verdade, não entende que tais relacionamentos sejam de sua alçada.
Conforme coloca o autor do Dictionary of
Psychoanalysis, "isso se deve ao feto de a psicanálise ser uma
psicologia do indivíduo e, portanto, discutir objetos e relacionamentos somente
do ponto de vista de um sujeito".7
Segundo
Freud, não são os outros que nos influenciam, mas sim nossas próprias ideias
a respeito dos outros, nossas projeções.
A influência freudiana é sempre uma transação
de ida sem volta, o que Buber chamaria de um relacionamento Eu—Isto, em que o
outro é um objeto, cuja representação levamos para dentro de nossa psique, onde
fazemos dela o que bem entendemos.
Não há uma dinâmica do relacionamento
interpessoal, só uma dinâmica da psique individual.
Seguindo
este modelo de relacionamento como representação do objeto, a aluna de Freud,
Melanie Klein, interpretou a identificação projetiva na qual duas pessoas parecem
entrar
uma
na outra e partilhar de uma só identidade (os amantes de Graves, a mãe e seu
filho, qualquer relacionamento Eu—Você) como, na verdade, um processo por meio
do qual se é "ingerido" pelo outro como objeto das próprias fantasias
dele:
O
ego toma posse de um objeto externo por projeção — em primeiro lugar, a mãe — e
o conduz a uma extensão do ser.
O objeto se torna, em certa medida, uma
representação do ego, e tais pessoas são, a meu ver, a base para a
identificação por projeção ou "identificação projetiva" (...) o
chupar do vampiro, o esvaziar do seio transformam-se, na fantasia infantil, num
abrir caminho para o seio e depois para o corpo da mãe.8
Klein,
como Freud, Sartre e Heidegger, não tem um modelo para o verdadeiro
relacionamento de duas vidas, do tipo que leva à intimidade.
Nenhum
deles consegue distinguir entre o modo como nos relacionamos com outras pessoas
e o modo como talvez nos relacionássemos com uma máquina, pois, para eles,
ambas, máquinas e pessoas, partilham da qualidade de objeto.
Todos
vivem à sombra do cogito isolado de Descartes e das impenetráveis bolas
de bilhar de Newton, sendo que a obra de cada um deles é, a seu modo, um
desdobramento inevitável daqueles protótipos de separação.
Assim,
"confissão errada", "representação do objeto" e
"chupar do vampiro" são os modelos de relacionamento que nos oferecem
alguns dos pensadores mais influentes deste século.
Cada um deles ganhou espaço na cultura geral e
contribuiu significativamente para o senso de alienação sentido por tantas
pessoas. Não é de admirar que outros pensadores — Parfit, Capra, Zukav, Bohm —
tenham procurado transcender essa alienação, negando totalmente a existência do
ser isolado e isolante.
Mas
o ser existe e, portanto, conforme sabemos de nossas intuições mais profundas,
os relacionamentos íntimos também.
"Eu"
e "nós" não são um caso de "ou/ou" mas de
"ambos/e".
Eu sou singularmente eu, algo dentro de mim
mesma que só eu posso ser, e sou também meus relacionamentos com os outros,
algo maior que eu mesma.
Postado por Dharmadhanna
Psicoterapeuta Transpessoal
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