domingo, 9 de novembro de 2014

A Ira e o grito dos oprimidos.



A Ira e o grito dos oprimidos.

O primeiro passo para ser livre da raiva impotente é deixá-lo contar toda a sua história,  e liberar os ocasionais rugidos. Muitas vezes, seria bom escrever sobre a sua raiva. Falando ou escrevendo. Depois de identificar o problema que está perturbando sua mente, e o próximo passo deve ser o de aprender tudo o que puder sobre sua ira. A raiva é sempre uma resposta à injustiça, que pode ser dissolvida com uma compreensão mais profunda.

A raiva é inimiga da Paz, não há alegria na vida daquele que vive armado para lutar, para vencer, para destruir.

O ódio nos separa da Unidade, nos veste com o colete da solidão, nos isola no campo de luta e de destruição.

A ira nos veste para a guerra diariamente, e revela nossa sombra ao mundo, para o outro somos um monstro horrível que ele precisa se afastar para não ser destruído.

Mas, quando você controla a ira, você controla o cavalo que carrega a sua alma (seu corpo, seus instintos de defesa, seu medo...)

Mas engolir a raiva e não ser assertivo, não é bom  - o fogo da ira, vai para o corpo, para a mente e envenena e pode causar doenças psicossomáticas. Dharmadhannya

A prática da felicidade.

Para mim, ser feliz significa sofrer menos. Se não fôssemos capazes de transformar a dor que existe dentro de nós, a feli­cidade seria impossível.

Muitas pessoas procuram a felicidade fora de si mesmas, mas a verdadeira felicidade precisa vir de dentro de nós. Nos­sa cultura tem muitas receitas de felicidade, e afirma que a atingimos quando possuímos uma grande quantidade de di­nheiro, muito poder e uma elevada posição na sociedade.

Mas, se você observar com cuidado, verá que numerosas pessoas ricas e famosas não são felizes. Até você já viveu esta expe­riência: depois de alcançar um bem material que desejava ardentemente, experimentou alegria durante um certo tempo, mas rapidamente voltou à insatisfação inicial, passando a dese­jar outra coisa. Este é um processo interminável e frustrante.

O Buda e os monges da época dele não possuíam nada, a não ser três mantos e uma tigela de comida, mas eram felizes porque tinham algo extremamente precioso - a liberdade.

De acordo com os ensinamentos do Buda, a condição bási­ca para a felicidade é a liberdade. Não estamos nos referindo aqui à liberdade política, e sim à liberdade que conquistamos quando nos libertamos da raiva, do desespero, do ciúme e das ilusões. Buda os descreve como venenos. Enquanto eles estão no nosso coração, é impossível ser feliz.


Neste texto vou lhes falar sobre a raiva, porque esta é uma emoção extremamente destrutiva e muito presente na nossa civilização. Vou procurar lhes ensinar a libertar-se dela, prati­cando o que chamo de exercício da Plena Consciência, inde­pendentemente de sermos cristãos, muçulmanos, budistas, hindus ou judeus.
Vou lhes dar instruções concretas sobre como transformar o anseio, a raiva e a confusão que existem dentro de nós. Se seguirmos essas instruções e aprendermos a cuidar do nosso sofrimento, alcançaremos a paz e podere­mos ajudar outras pessoas a fazer a mesma coisa.

Estamos muito estruturados em nossos comportamentos.
Vivemos num Mundo violento e reproduzimos, desde muito cedo, sem nos darmos conta, essa violência nos pequenos gestos do cotidiano, na relação com nossos parceiros, filhos, família, companheiros de trabalho, pessoas com quem cruza­mos na rua.

Regamos abundantemente a semente da raiva existente dentro de cada um de nós, e nos descuidamos das sementes do amor, da compaixão, da doçura, da solidarieda­de. Solidificamos os hábitos agressivos e recebemos agressão de volta, num processo sem fim.

Para que essa estrutura seja desmanchada, para que as sementes positivas sejam nutridas e para que o hábito se transforme, é necessário ouvirmos muitas vezes os novos con­ceitos, as novas práticas, os novos ensinamentos.

 Por isso eles serão repetidos no correr desta reflexão, para que impregnem o seu ser, condicionem uma nova consciência, comecem a se traduzir nas suas atitudes, e tragam, para você e para o mun­do, a paz, a felicidade e a harmonia que todos buscamos.


Mudando para melhor
Suponhamos que, numa determinada família, pai e filho estão com raiva um do outro. Eles não conseguem mais se comunicar e por isso sofrem muito. Nenhum dos dois quer permanecer preso a raiva que estão sentindo, mas não sabem como dominá-la.

Quando estamos com raiva, sofremos como se estivésse­mos ardendo no fogo do inferno. Quando sentimos um gran­de desespero ou ciúme, estamos no inferno. Precisamos, nes­ses momentos, procurar um amigo ou uma amiga que nos ajude a transformar a raiva e o desespero que ardem em nós.

Ouvir com compaixão alivia o sofrimento

Quando as palavras de uma pessoa estão cheias de raiva, é sinal de que ela está sofrendo profundamente. Por sofrer tan­to, ela fica cheia de amargura, torna-se agressiva e está sem­pre pronta a se queixar e culpar os outros por seus proble­mas. Por isso você acha muito desagradável escutar o que ela tem a dizer e procura evitá-la.

Para compreender e transformar a raiva, precisamos apren­der a ouvir com compaixão e usar palavras amorosas. Com­paixão não é pena, é solidariedade, é colocar-se no lugar do outro para compreender o que ele sente.

 Existe um Bodisatva - um Grande Ser - capaz de ouvir profundamente e com gran­de compaixão. Quando somos capazes de ouvir alguém com compaixão, como este Grande Ser, conseguimos aliviar o so­frimento e oferecer uma orientação concreta àqueles que nos procuram em busca de ajuda. Não tenha pressa.

Fique tran­quilamente ao lado da pessoa durante o tempo que for neces­sário e escute o que ela tem a dizer, deixando que ela se ex­presse livremente. Repito, você poderá aliviar grande parte do sofrimento dela se mantiver viva a compaixão durante todo o tempo em que a estiver ouvindo.

Você precisa se concentrar bastante enquanto escuta, ou­vindo com todo o seu ser: com os olhos, os ouvidos, o corpo e a mente. Se você apenas fingir que está ouvindo e não se  esforçar para prestar atenção com a totalidade do seu ser, a outra pessoa perceberá isso e o sofrimento dela não será aliviado.

Não é fácil manter essa concentração, porque o nos­so pensamento se evade muitas vezes. Mas se você respirar serena e profundamente e trouxer de voltada atenção sempre que ela se dispersar, com o desejo sincero de ajudar a pessoa a encontrar alívio, você será capaz de sustentar a compaixão enquanto estiver ouvindo.
Ouvir com compaixão é uma prática muito profunda. Você não ouve para julgar ou culpar ninguém.

 Você só escuta porque quer que a outra pessoa sofra menos. Ela pode ser seu pai, seu filho, sua filha, seu companheiro ou alguém amigo. Ouvir a outra pessoa pode efetivamente ajudar a transformar a raiva e o sofrimento dela.

Uma bomba prestes a explodir

Conheço uma mulher que mora na América do Norte. Ela sofria muito porque seu relacionamento com o marido era extremamente difícil. O casal tinha uma formação acadêmica elevada, mas o marido estava em guerra com a mulher e os filhos, não conseguindo muitas vezes nem mes­mo falar com eles.

Todos na família procuravam evitá-lo, por­que ele era como uma bomba prestes a explodir. A raiva dele era enorme, o que o fazia sofrer bastante. Ele achava que a mulher e os filhos o desprezavam, porque se afastavam dele. Não era desprezo o que a mulher e os filhos sentiam, era me­do. Ficar perto daquele homem era perigoso, porque ele podia explodir a qualquer momento.

Certo dia, a esposa pensou em se matar porque não podia mais suportar a situação. Mas, antes de cometer suicídio, ela telefonou para uma amiga que era praticante do budismo e contou o que estava planejando. A amiga a havia convidado várias vezes para praticar a meditação, a fim de sofrer menos, mas ela sempre recusara o convite.

Ao tomar conhecimento de que a amiga pretendia se mata. A mulher budista disse ao telefone: “Se você é de fato minha amiga, quero lhe fazer um pedido. Tome um táxi e venha até a minha casa.”

Quando a mulher chegou, a amiga insistiu para que ela ouvisse uma fita que continha uma palestra do Darma que ensinava como restabelecer a comunicação com os outros, sobretudo os mais próximos.

Deixou-a sozinha na sala e, quando voltou, uma hora e meia depois, a amiga passara por uma grande transformação. Ela descobrira muitas coisas. Com­preendera que era em parte responsável pelo próprio sofri­mento e que também tinha causado um grande sofrimento ao marido, pois não fora capaz de ajudá-lo.

 Entendeu que a raiva do marido era causada por um grande sofrimento e que o fato de evitá-lo apenas aumentava sua dor. As palavras da fita a fi­zeram entender que, para ajudar a outra pessoa, ela tinha que ser capaz de ouvir com profunda compaixão. Deu-se conta de que não conseguira fazer isso nos últimos cinco anos.

Desarmando a bomba
Depois de ouvir a palestra do Darma, a mulher sentiu um inten­so desejo de ir para casa, procurar o marido e pedir-lhe que falasse de seus sentimentos, para ajudá-lo. Mas a amiga budista lhe disse: “Não, minha amiga, você não deve fazer isso hoje, porque, para ouvir com compaixão, é preciso treinar durante pelo menos uma ou duas semanas.” A budista convidou então a amiga  para participar de um retiro, onde ela poderia aprender mais.

Quatrocentas e cinquenta pessoas participaram do retiro, comendo, dormindo e praticando juntas durante seis dias praticaram a respiração consciente, permanecendo atentas ao ar que entrava e saía, para unir o corpo e a mente.

 Praticaram o andar consciente, concentrando-se em cada passo, e o sen­tar consciente, para se tornarem capazes de observar e abra­çar o sofrimento à sua volta.

Além de ouvir palestras sobre o Darma, todas praticaram a arte de escutar umas às outras e usar palavras amorosas. Tentaram ouvir profundamente o que a outra dizia para com­preender seu sofrimento.

A mulher entregou-se com muita seriedade e profundidade à prática, porque para ela se tratava de uma questão de vida ou morte.

Ao voltar para casa depois do retiro, ela se sentia muito cal­ma, com o coração repleto de compaixão, querendo sincera­mente ajudar o marido a desarmar a bomba que pulsava den­tro dele. Ela se movia devagar, prestando atenção em seus pas­sos e respirando lenta e conscientemente para permanecer cal­ma e alimentar sua compaixão.

O marido notou imediatamente a mudança e surpreendeu-se quando a mulher se aproximou e se sentou perto dele, algo que não fazia há cinco anos.

Ela ficou em silêncio durante talvez dez minutos e depois colocou delicadamente a mão sobre a dele, dizendo: “Querido, eu sei que você tem sofrido muito nos últimos cinco anos e sinto muito por isso.

Sei que sou em grande parte responsável pelo seu sofrimento. Cometi muitos erros e lhe causei muita dor, mesmo sem desejar. Sinto de fato muitíssimo. Gostaria que você me desse a chance de recomeçar. Quero fazer você feliz, mas não tenho sabido como, e não quero mais continuar desse jeito.

 Por isso, querido, preciso que você me ajude a com­preendê-lo melhor para poder amá-lo melhor. Por favor, me diga o que se passa no seu coração. Eu sei que você sofre mui­to, mas preciso conhecer seu sofrimento para não repetir os mesmos erros do passado.

 Se você não me ajudar, não posso lazer nada. Preciso da sua ajuda para parar de magoá-lo. Tudo o que eu quero é amar você.” Ao ouvi-la falando dessa ma­neira, ele começou a chorar. Chorou como uma criança.
Sua mulher estivera amarga durante muito tempo. Ela gri­tava o tempo todo, criticando-o, e suas palavras eram cheias de raiva e agressividade. Tudo o que eles faziam era brigar um com o outro. Há anos ela não falava com ele daquele jeito, com tanto amor e carinho.

Quando ela viu o marido chorar, soube que tinha uma chance. A porta do coração do marido começava a se abrir de novo. Ela sabia que precisava ter muito cuidado e por isso continuou a praticar a respiração consciente.

 Disse apenas: “Por favor, meu querido, abra seu coração para mim. Quero aprender a fazer melhor as coisas, para não continuar a cometer erros.”

Toda a formação acadêmica dos dois não lhes ensinara a ouvir um ao outro com compaixão. Mas aquela noite foi um marco na vida daquele homem e daquela mulher, porque ela aprendera a ouvir com compaixão. Passaram muitas horas conversando, e este foi o início de uma feliz reconciliação.

Ensinamento correto, prática correta
Quando a prática é correta e adequada, poucas horas podem ser suficientes para produzir a transformação e a cura. A conversa daquela noite fez com que o marido se inscre­vesse também em um retiro.
Esse retiro durou seis dias e também causou no marido uma grande transformação. Durante uma meditação do chá, ele apresentou a mulher aos outros participantes, dizendo: “Que­ridos amigos e companheiros, gostaria de apresentar a vocês um Bodisatva, um Grande Ser.

Trata-se da minha mulher, um grande Bodisatva. Eu a fiz sofrer muito nos últimos cinco anos. Fui um completo idiota. Mas ela conseguiu mudar tudo. Ela salvou minha vida.” A seguir, os dois contaram sua história e o que os levara a participar do retiro. Descreveram também como foram capazes de se reconciliar num nível profundo e renovar o amor que sentiam um pelo outro.
Quando um agricultor usa um tipo de fertilizante que não surte efeito, ele precisa trocar o produto. O mesmo acontece conosco. Se depois de vários meses nossa prática não tiver ocasionado nenhuma transformação ou cura, temos que re­considerar a situação.

Precisamos modificar nossa maneira de ver as coisas e aprender mais, para descobrir a forma capaz de transformar nossa vida e a vida das pessoas que amamos.

O importante é descobrir e aprender a prática correta. Se você se empenhar seriamente nisso, sabendo que sua felici­dade depende desse exercício, tal como a mulher da história que acabei de contar, você será capaz de mudar tudo.

Como tornar possível a realidade
Vivemos numa época que dispõe dos mais sofisticados meios de comunicação. As informações viajam rapidamente de um lado para outro do planeta. No entanto, é exatamente neste momento que a comunicação entre as pessoas - pai e filho, marido e mulher, mãe e filha - se tornou extremamente difícil.

 Se não conseguirmos restabelecer a comunicação, a felicidade jamais será possível. No ensinamento budista, as práticas de ouvir com compaixão, usar palavras amorosas e cuidar da nossa raiva são apresentadas com muita clareza.


 Se quisermos restabelecer a comunicação e trazer a felicidade para a nossa família, para nosso espaço profissional e para nossa comunidade, temos que colocar em prática os ensina­mentos do Buda sobre ouvir profundamente e falar com amor. Só então poderemos ajudar outras pessoas no mundo. Thich Nhat Hanh
este texto está livre para divulgação desde que seja citada o endereço do blog.
Pesquisado por Dharmadhannya

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