sábado, 14 de junho de 2014

Polaridade e correspondência. Humberto Hoden Kaibalion



2 e 3 — Polaridade e correspondência. Humberto Hoden
Kaibalion
Estes dois princípios, aparentemente opostos, comple­tam-se um ao outro.

 A polaridade é o princípio da contrariedade, a correspondência é o princípio da identidade. Aquele é como que centrífugo, dispersivo: este centrípeta, conver­gente, aquele produz diferenciação; este gera integração.

No TODO (Deus), a polaridade e a correspondência se acham em estado de quietação ou equilíbrio dinâmico, por­que o TODO é o grande e único UM, anterior aos muitos; ele não é nenhum dos ímpares: 1, 3, 5, 7, 9, nem dos pares: 2, 4, 6, 8, como diria Pitágoras.

 O TODO é a grande TESE, anterior a todas as antíteses e sínteses de que é composto o mundo fenomenal. A Tese é pré-antitética e pré-sintética.


A polaridade manifesta-se no mundo, sobretudo no mundo autoconsciente, como individualidade no plano obje­tivo do ser, e como egoísmo no plano subjetivo do agir.

Cada indivíduo, sendo um dos polos da antítese, procura necessa­riamente os seus interesses particulares, unilaterais; é in­dividualista e exclusivista.

Sendo que a individualização e o seu natural complemento, o egocentrismo, é da própria natureza dos indivíduos personais, é de todo impossível extir­par o egoísmo em si mesmo, procurando matá-lo diretamente.
 O único meio de remediar os males
 que o egoísmo descontro­lado pode produzir é integrá-lo num Todo maior, ou, se possível, no TODO último e absoluto. 

A integração do Ego individual no Nós social da humanidade se chama altruísmo ou ética; a integração do Eu individual no TODO CÓSMICO
                  o que, naturalmente, inclui o Nós humano — chama-se mística ou religião, no mais alto sentido da palavra: re- ligar (religio) o indivíduo finito com o Universal Infinito
                  isto é “religião”.

Essa integração, parcial ou total, do indivíduo polari­zado é que se chama correspondência. A correspondência é, pois, o complemento da polaridade, assim como a integração é a complementação natural da diferenciação.

A polaridade dissocia — a correspondência associa.
Para haver uma associação perfeita e fecunda deve pro­cedê-la uma dissociação.
 Uma sociedade constante apenas de indivíduos amorfos, não suficientemente individualizados e caracteristicamente diferenciados, seria uma sociedade monótona, incolor, moluscóide.

 Por outro lado, uma socie­dade constante de indivíduos altamente diferenciados, mas não devidamente integrados seria uma sociedade caótica, desarmonizada, sempre em vésperas de esfacelamento.
Diferenciação mais integração, ou, na linguagem her­mética, polaridade mais correspondência, gera exuberância de harmonia, vida, beleza, felicidade.

Todos os departamentos do mundo fenomenal obedecem ao princípio da polaridade e da correspondência.

 O mundo mineral, desde os átomos até aos astros, revela esses princípios nos fenômenos de repulsão e atração, donde resulta a harmonia do microcosmo atômico e do macroscomo astronômico.
 No mundo da eletro-física, os dois princípios apare­cem como polos positivo e negativo, dando em resultado luz, calor e força.

No mundo orgânico, essa lei de polaridade e correspondência é conhecida como sexos, masculino e feminino, produzindo, além da integração humana dele e dela, um terceiro, indivíduo representante dos dois.

Na vida social, os indivíduos diferenciados represen­tam a polaridade ou antítese, e a sua espontânea integração no Todo social concretiza a correspondência. Nas relações sociais entre o Eu e o Nós, três atitudes são possíveis:

Eu — Nós (Eu sem Nós) = egoísmo suave
Eu x Nós (Eu contra Nós) = egoísmo violento
Eu + Nós (Eu com Nós)        = altruísmo, amor

 No mundo da metafísica, os princípios da polaridade e da correspondência se manifestam como Causa e efeitos, Absoluto e relativos, Universal e individuais, Eterno e tem­porais.

 E’ da íntima natureza do TODO (Deus) que seja UM em sua essência e muitos em suas aparências ou apare­cimentos.

 O UM é, por assim dizer, o princípio masculino de Deus, o muito é o seu princípio feminino. Através da Mãe-Natura se revela, sem cessar, o Pai-Celeste.

 E a fecundidade do divino Pai é inesgotável. A unidade é do SER, a pluralidade é do AGIR. Aquele é o Númeno, este são os fenômenos.

Na vida ética do homem, o princípio da correspon­dência exige que “ame os outros”, e o da polaridade diz “como a si mesmo”.

Nos domínios da estética e das artes revelam-se esses dois princípios como as leis da assimetria e da simetria, da dissonância e da consonância, das sombras e das luzes, do forte e do piano, da unidade e da variedade.

A filosofia distingue diversos planos de correspondência no mundo fenomenal, que podem ser reduzidos a cinco ní­veis principais, a saber:

— o plano mineral (matéria);
— o plano astral (energia);
— o plano vital (vegetal e sensitivo);
— o plano mental (inteligência);
— o plano racional (espiritual).

Todos esses planos se acham entrelaçados uns com os outros e todos eles estão permeados de vida em diversos graus de perfeição ou intensidade. Não há nada absolutamente morto, passivo, inerte.

Todos esses planos são doadores e recebedores. As vibra­ções de cima repercutem nas zonas de baixo, e as de baixo ecoam nas zonas de cima. 
O cosmos é um e uno, não só em seu ser, senão também em seu agir, uma vez que “o agir segue ao ser” (agere sequitur esse).

Para além de todos os planos — não extensiva mas in­tensivamente — está o TODO, a CAUSA prima ou última de tudo. Esse Todo não é a soma total dos planos, mas a fonte e base de todos eles.

 Esse Todo transcende todos os planos, mas não deixa de ser imanente a cada um deles, assim como a vida cósmica, intimamente presente em cada ser vivo, ultrapassa infinitamente todos os seres vivos. Cada ser vivo tem vida, mas nenhum deles é a Vida. A transcen­dência exige a imanência do Todo em cada parte.

 Visto de um plano superior, alguns dos planos inferiores parecem privados de vida e de consciência, o que não passa, todavia, de uma ilusão subjetiva do observador não assaz clarividente.
Como foi dito, não existe nem pode existir nenhum ser totalmente morto, inerte, inconsciente. Reali­dade, atividade, vida, consciência — são, de fato, sinônimos e até homônimos.
 Do grau de consciência que um ser possuí depende a sua perfeição. 

Ser que fosse absolutamente in­consciente, morto, inerte, seria um ser irreal, isto é, um não- ser, um puro nada.
Deus, a infinita Realidade, é também a infinita ati­vidade, vida, consciência, a oniconsciência, ultrapassando tempo, espaço e causalidade (passiva).

Há, no universo, seres dotados de diversos graus de potencialidade. Essa potencialidade é que é a verdadeira natureza de um ser. A natureza de um ser é aquilo que ele pode vir a ser atualmente, embora o seja apenas poten­cialmente, agora.

 Há seres que estão e ficarão para sempre no plano mineral; outros, no plano astral; outros, no plano vital vegetativo e sensitivo; outros, no plano mental; ou­tros ascenderão ao plano racional ou espiritual.

Entretanto, onde a consciência e liberdade atinge certo grau de evolução, há maior possibilidade do que para os seres inferiores de subirem ao plano superior.

Esses planos não representam, pois, lugares geográficos ou astronômicos, mas estágios evolutivos da consciência de um ser. Cada plano é caracterizado pelo grau de consciên­cia que os seres nele existentes têm do grande Todo (Deus).
Entre parêntesis: a esses planos se refere o grande ini­ciado de Nazaré; quando diz que “em casa de seu pai há muitas moradas”.
 Morada quer dizer um lugar, ou estágio onde se pode “morar” ou “demorar” por algum tempo, para, depois, prosseguir a sua jornada rumo à “morada” imedia­tamente superior, em demanda do Todo.

“Como acima assim embaixo — como abaixo assim aci­ma” — este conhecido axioma hermético exprime a grande lei da correspondência, indicando que nada acontece nos planos superiores do universo que, de um ou dê outro modo, não afete os planos inferiores, e vice-versa.

 O mundo é, de fato, um genuíno “uni-verso”, quer dizer, “um” em “di­versos”, um organismo constante de inúmeras unidades in­dividuais integradas no grande Todo e inter-relacionadas en­tre si.
Poderíamos dizer que o princípio da correspondência, completando o da polaridade, afirma a organicidade do cos­mos, ou seja, a lei da cooperação recíproca; não existe no universo um único indivíduo, uma única célula, um único átomo, próton ou eléctron, ou outra unidade mínima, em estado realmente isolado, separado das outras unidades, em­bora cada indivíduo seja distinto dos outros.

A polaridade afirma a distinção.
A correspondência nega a separação.
O universo é, pois, uma profunda unidade com distinção- — e uma vasta diversidade sem separação.

Unidade sem variedade seria monotonia.
Variedade sem unidade seria caos.
Unidade com variedade é harmonia.

Esta imensa harmonia é chamada, em diversas línguas: Universo, Cosmos, Tao, Brahman. Humberto Hoden

O Poder do UM está na harmonia da União. Dharmadhannya


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