domingo, 16 de novembro de 2014

Parceiros Invisíveis - Anima e Animus



 Parceiros Invisíveis - Anima e Animus (Primeira parte )
Resumo de vários Mestres Junguianos.

Jung chamou os opostos existentes no homem e na mulher de anima e animus. Anima significa o componente feminino numa personalidade de homem, e o animus designa o componente masculino numa personalidade de mulher.

 Ele tirou tais palavras do termo latino animare, que quer dizer animar, avivar, porque sentiu que a anima e o animus se assemelhavam a almas ou espíritos animadores, vivificadores, para homens e mulheres.

A anima e o animus são imagens psíquicas, ou imagens da “Alma” que aparecem em sonhos como vários personagens com várias faces,   nos contos de fadas - a fada, a princesa (anima), o príncipe, o rei ( animus), nos mitos, na grande literatura mundial, e — o que é mais importante — nos variados fenômenos do comportamento humano.

 Pois a anima e o animus são os Parceiros Invisíveis presentes em todos os relacionamentos humanos e em toda busca da plenitude individual por parte da pessoa.

Os efeitos negativos da anima e do animus estão diretamente relacionados com a falta de percepção e a desvalorização, por parte do homem, de seu lado feminino, e com a falta de percepção da mulher de seu lado masculino.

 Para Jung, o que caracteriza a feminilidade da anima é o sentimento, enquanto o animus está ligado predominantemente ao pensamento racional, essencialmente masculino. No processo de individuação, integrar a anima para os homens e o animus para as mulheres é uma das etapas fundamentais, vindo logo depois da integração da sombra e imediatamente antes da realização do Si-mesmo.

Para o homem a figura materna, geralmente a mãe biológica, é o primeiro objeto a receber a projeção da anima, ainda quando menino, o que se dá inconscientemente. O menino inconsciente deste processo ao crescer aos poucos, consegue retirar esta projeção da mãe e irá lançando-a a outras mulheres.

Anima e animus são responsáveis pelas qualidades das relações com pessoas do sexo oposto.  Enquanto inconscientes, o contato com estes arquétipos
são feitos em forma de projeções.

...Somente a união desses dois princípios é que constitui um ser humano completo. A união deles se realiza em todo homem e em toda mulher, dentro de sua natureza bissexual, andrógina, e isto ocorre também através da intercomunhão entre as duas naturezas, a masculina e a feminina”.  O homem, quando se apaixona por uma mulher, está projetando a imagem da mulher que ele tem internalizada.


....Desse modo, essa idéia da natureza andrógina do homem já é antiga, muitas vezes foi expressa na mitologia e mediante os grandes espíritos intuitivos dos tempos passados.

Mitos e contos de fada, sendo representações espontâneas da realidade psicológica, muitas vezes representam a anima e o animus e, através de seu conjunto vivo de estórias, nos mostram como eles podem atingir a vida humana.

Tomem, por exemplo, o mito grego de Circe, que era um ser feminino mortal, conhecido por seus encantamentos e más influências. Ela envenenara seu marido e fora morar num belo castelo na ilha de Ea.

Por meio da mágica, ela tinha o poder de encantar qualquer homem que andasse vagando pelas praias de sua ilha, e conseguia transformá-lo num animal. A mais famosa estória sobre Circe encontra-se na Odisséia.

 Os homens de Odisseu aventuraram-se a ir até a ilha e foram bem recebidos por Circe, que os entreteve e lhes ofereceu um magnífico banquete no seu palácio; no entanto, exatamente no auge de seu prazer e de seus divertimentos, Circe descarregou os maus fluidos que possuía sobre os homens e eles se transformaram em porcos.

 O próprio Odisseu [Ulisses], felizmente, havia sido previamente avisado pelo deus Hermes, que lhe dera uma erva que continha um antídoto contra os fluidos mágicos de Circe.

 Assim preparado, Ulisses ou Odisseu, finalmente, foi capaz de conseguir o melhor de Circe e obrigou-a a libertar seus homens dos seus passes mágicos. Mesmo então, porém, o fascínio dela foi tão grande que Odisseu permaneceu com ela na ilha durante um ano, esquecendo-se de sua esposa, Penélope, e da premente necessidade de regressar à sua terra natal.

As sereias, que também encontramos na Odisséia, eram tão perigosas quanto Circe. As sereias eram criaturas femininas um tanto temíveis, com corpos de peixe e cabeças de mulheres.

 Elas conseguiam cantar músicas incrivelmente melodiosas, de tal modo atraentes que nenhum homem que ouvia suas músicas podia resistir e deixar de ir ao encontro delas.

Uma vez, porém, houve um homem que se aproximou delas; as sereias caíram cm cima dele e o despedaçaram, juntando seus ossos a um monte de esqueletos dentre os vários espalhados pela terrível ilha.

 O próprio Odisseu poderia ter sido vítima das sereias, se não houvesse sido prevenido por Circe. Quando seu navio passou pela ilha onde moravam as sereias, ele obrigou seus homens a taparem os ouvidos para não ouvir a música mortal, enquanto ele próprio se amarrou fortemente ao mastro. Dessa maneira, mesmo ouvindo a música, foi capaz de passar ileso pelas sereias.

Em ambos os contos, temos seres femininos que são extremamente perigosos para os homens. Eles possuem um grande poder sedutor, e conseguem enganar os homens com suas propostas de prazer ou com a música, levando-os a um estado de inconsciência.

 Então, depois que os homens ficam seduzidos e impotentes, eles os destroem. A transformação dos homens de Odisseu em porcos representa a redução da consciência masculina à sua natureza mais baixa, mais semelhante ao porco, e um estado psicológico em que o homem se identifica com seu apetite pelo sexo e pelo prazer.

 A destruição dos homens pelas sereias personifica o modo como o poder mortal da anima pode dilacerar a consciência masculina, deixando-a em farrapos, mediante a indução dos homens a um estado de inconsciência com promessas de felicidade e de prazer.

 Dessa maneira, a mitologia grega personificou o lado perigoso e mortal da anima, capaz de levar o homem à sua própria destruição.

Poderíamos dizer que Marco Antônio se sentiu vítima e presa dos maus efeitos da anima no seu aspecto de Circe e de sereia, pois ele se identificou com seus apetites de prazer e foi induzido à sua destruição pela qualidade semelhante à sereia da anima que ele projetou em Cleópatra.

Odisseu ou Ulisses foi capaz de escapar da má sorte, porque fora previamente advertido, isto é, ele se tornou consciente do sentido da situação. Apoiado no conhecimento que tinha da natureza mortal de Circe, o herói é capaz de superar seu lado perigoso e de experimentar seu lado útil, já que é ele quem o adverte contra as sereias e lhe mostra como pode passar ileso por elas.

Os homens de Ulisses, que geralmente representam a consciência, não ouvem o canto das sereias, mas Ulisses ouve. O herói é o homem que fica plenamente exposto à anima e a seus efeitos, mas que se acha psicologicamente esclarecido e que não se torna vítima do seu lado negativo.

Um exemplo impressionante do lado perigoso do animus encontrasse na estória de Tobias, incluída na Bíblia. A estória conta-nos que a bela jovem Sara estava possuída por um demônio Asmodeu Sara fora casada sete vezes, mas todas as vezes o demônio Asmodeu viera durante a sua noite de núpcias e matara seu marido.

 Sara reza a Deus, que Ouve sua oração e resolve ajudá-la. Deus também ouve a oração do velho justo e cego, Tobit, e de seu filho, Tobias, e envia o anjo Rafael para auxiliar o ancião e o filho, bem como a jovem mulher Sara.

Rafael toma Tobias para uma viagem e, durante o caminho, eles chegam a um rio. Tobias desce ao rio para banhar-se, quando um peixe salta diante dele, só não o engolindo porque Rafael lhe gritou: “Agarre o peixe”.

 Tobias apanha o peixe e arrasta-o até a terra; depois, seguindo as instruções do anjo, arranca-lhe o coração, o fígado e o fel, e leva-os consigo. Ocasionalmente, chegam à casa de Sara, onde Tobias ouve Rafael dizer--lhe que ele deve casar-se com a jovem. No primeiro momento, Tobias se opõe à ordem.

 “Ouvi dizer — replica ele — que a moça já foi dada a sete maridos e que todos morreram na noite de núpcias... por isso tenho medo.  A ela o demônio não faz nenhum mal, porque a ama; ele mata, porém, quem queira aproximar-se dela”.

 Mas o anjo o instrui no sentido de queimar o coração e o fígado do peixe, produzindo com isso uma fumaça; disse-lhe ainda que, quando o demônio sentisse o cheiro da fumaça, fugiria para as regiões mais longínquas da terra.

Tobias fez o que lhe foi mandado. Ele se apaixonou por Sara, casou-se com ela, e à noite preparou a fumaça com o coração e o fígado do peixe; Asmodeu, ao sentir tal cheiro, foi definitivamente afugentado.

Asmodeu personifica o animus, que, quando se apropria de uma mulher, age como um demônio. Ficamos como que possuídos por um conteúdo inconsciente quando o ignoramos e não mantemos relacionamento com ele, entretanto ele nos ajuda quando estamos relacionados com ele.

 Tornar-se consciente ou atento conhecedor dos conteúdos do inconsciente é a maneira mais segura de estabelecer um relacionamento. Já se disse, falando dos complexos que perturbam o inconsciente, que a maioria das pessoas duvida ter algum complexo; elas ignoram que seus complexos é que as possuem, é que tomam conta delas.

Assim, Asmodeu possui Sara e, porque a possui, é um demônio. Ele destrói os sete maridos dela porque o animus, quando possui uma mulher, passa a ser destruidor dos relacionamentos humanos e dos valores do eros.

O anjo e o peixe simbolizam os poderes curativos do inconsciente, e, mais especificamente, o poder de uma vida espiritual.

 Como Jung observou certa vez, um antídoto contra a possessão do demônio consiste em ter uma alma cheia de um espírito mais poderoso do que o do demônio. Quando Tobias queima o coração e o fígado do peixe e produz com eles uma fumaça, é como se uma nova força espiritual entrasse na alma de Sara, e, a partir de então, deixa de haver lugar para o mal e para as forças demoníacas. Tobias, evidentemente, também despertou o eros de Sara e fez nascer nela o desejo de um homem e do relacionamento com ele.

 Esse calor humano e esse eros também têm a capacidade de afastar as forças do mal. Assim, o relato nos dá a chave para saber como uma mulher pode destruir os efeitos mortais do animus: a alma dela precisa estar cheia de um espírito mais poderoso do que o do animus destruidor, e sua capacidade para o eros e o relacionamento deve estar viva.

O demônio Asmodeu, a feiticeira Circe e as sedutoras sereias simbolizam os efeitos destruidores do animus e da anima. São geralmente esses efeitos negativos que experimentamos em primeiro lugar e que precisam ser superados para que os aspectos positivos dos Parceiros Invisíveis possam realizar-se. Os efeitos negativos e destruidores constituem a “má notícia” sobre o animus e a anima.

 Os efeitos negativos da anima e do animus estão diretamente relacionados com a falta de percepção e a desvalorização, por parte do homem, de seu lado feminino, e com a falta de percepção da mulher de seu lado masculino.

  Nos homens, a anima (sua parte feminina) tende a impedi-los de reconhecer o erro de proporção que cometem não reconhecendo e não respeitando adequadamente os valores femininos existentes em si, na vida e nas mulheres.

 Por esse motivo, os homens precisam aprender a conversar com mulheres e a ouvi-las, porque a mulher pode, então, ensinar ao homem o que é importante para ela; dessa maneira, ele se relaciona melhor com o eros e seus valores.

 Isso facilita seu relacionamento adequado com a anima, um problema importante, pois, ao lidar com figuras arquetípicas do inconsciente, a chave está no relacionamento. Em seu aspecto positivo a anima, quando reconhecida e integrada à consciência, servirá como guia e despertará, no homem o desejo de união e de vínculo com o feminino e com a vida.

 Quando tais figuras se acham relacionadas com a consciência, a integração dos opostos no centro da consciência revelam a harmonia interna, seu lado positivo tende a se manifestar; de modo contrário, o que tende a aparecer é o seu lado “demoníaco”.

No caso da anima, é ela que fica por trás das disposições de humor  de um homem. Quando um homem está inconsciente “possuído”, pela anima, ele passa a ter tristeza, tende a ficar de mau humor, irritado, agressivo, extremamente sensível e perturbado e não consegue pensar racionalmente e pode ficar mergulhado no oceano de emoções.

 Uma atmosfera envenenada o envolve e ele parece imerso numa espécie de nuvem psicológica.

 Ele deixa de ser objetivo ou relacionado, e suas atitudes masculinas ficam prejudicadas pela impertinência ou rabugice. Quando um homem fala ou escreve em tal estado de espírito, essa impertinência ou rabugice e esse veneno certamente virão à tona.

Ao escrever, a influência da anima pode ser percebida através de sarcasmos, indiretas, irreverências e piadas venenosas que revelam um desvio subjetivo e de personalidade, bem como prejudicam a qualidade objetiva do trabalho.

 Um homem sob as garras da anima age, diante de todo o mundo, como um tipo inferior de mulher que está perturbada com alguma coisa e que, de fato, corresponde exatamente ao que ele traz dentro de si.

Um tal estado de espírito pode acometer um homem repentinamente. Uma observação aparentemente ocasional feita por alguém, um leve, quase imperceptível desapontamento bastam para, de um momento para outro, um homem entrar em tal estado. De modo bastante espantoso, os homens, quase que invariavelmente, deixam de perceber que algo existente dentro deles mesmos passou a possuí-los subitamente, que se viram invadidos e envolvidos por más disposições e mau humor, e que o acontecimento se verificou de maneira autônoma.

Tais disposições podem simplesmente tornar o homem desagradável e aborrecido durante algum tempo, mas também podem transformar-se num túnel escuro e perigoso. Quando as más disposições passam a ser crônicas, elas podem levar o homem ao alcoolismo ou a profunda depressão. Nesse caso, o homem não consegue se relacionar com as mulheres está possuído pela  anima.

Em certas circunstâncias, uma intensa má disposição de anima pode mergulhar o homem em tal estado de desespero que ele chegue a cometer o suicídio. Não existe dúvida de que o desequilíbrio interior com o seu lado feminino  - presença da anima dentro de um homem é que explica por que menos homens do que mulheres tentam o suicídio, mas mais homens do que mulheres realmente chegam a se suicidar. como se a anima dissesse: “Tudo é tão fútil!” E o homem cai no supremo desespero.

A mulher na vida de um homem poderia mostrar-lhe uma porção de coisas sobre essas disposições da anima. Ela conhece, com quase certeza, quando a má disposição atinge seu marido, porque então ele fica impotente para o relacionamento.

 Não se consegue atravessar a má disposição para encontrar o homem. É como se ele tivesse desaparecido e outra pessoa houvesse assumido o seu lugar. Esse mau humor do homem acarreta, como resultado, um efeito perturbador na mulher, que acha difícil conviver com um homem num tal estado.

Se você conseguir chegar à raiz da indisposição e mau humor de um homem, você descobrirá que houve alguma coisa errada; o homem, porém, dificilmente compreende o que seja.

Pode ser que a sua mulher interior não esteja gostando do que o homem está fazendo. Por exemplo, ela pode não gostar do trabalho dele, porque este esgota a vida e a energia dela, ou porque pode impedi-la de atingir a sua realização na vida.

 É como se a mulher interior do homem e o homem interior da mulher também precisassem de se realizar na vida, mas a única maneira de atingirem tal meta dependesse do tipo de vida que o homem exterior ou a mulher exterior deles leva.

 Imagine uma mulher que tenha renunciado ao seu objetivo na vida, que seja forçada a suportar um modo de vida que não lhe deixe lugar para suas emoções ou para seus poderes criativos.

Uma mulher assim, naturalmente, haveria de ficar insatisfeita e seu dissabor poderia ser sentido na desagradável atmosfera que ela cria. É exatamente o que acontece com a anima, quando ela não participa criativamente e suficientemente da vida do homem.

A disposição negativa da anima, entretanto, pode também ser uma função do relacionamento. Por exemplo, um homem pode entrar nesse estado de espírito quando seus sentimentos são feridos. Talvez alguém o tenha ignorado, alguém lhe tenha dito um desaforo ou o tenha rejeitado de alguma forma; e, com isso, ele fica sentido e zangado.

Quando acontece de um homem ser ofendido, se ele puder expressar seus sentimentos diretamente, tudo se resolverá muito bem — ele não ficará de mau humor. Se, por exemplo, tiver sido sua mulher quem ofendeu seus sentimentos e se ele puder dizer-lhe:

“Realmente você me põe zangado quando diz isso”, ele terá oportunidade de ser ele mesmo e não se deixará possuir pela anima; não ficará de mau humor por causa do fato.

Mas, se ele não puder expressar seus sentimentos, estes cairão no inconsciente e a anima tomará conta deles. O aborrecimento que o homem não manifesta diretamente é captado pela anima, que o transforma em ressentimento; na verdade, o ressentimento em um homem é sempre um sinal de que a anima está em ação.

 Nas mãos da anima, esse aborrecimento não expresso nem resolvido ferve, arde dentro dele, corroendo-o, e vai expressar-se indiretamente por disposições e comportamentos “agressivo-passivos”.

 Ele está sempre pronto a explodir; no caso, o homem não tem a sua raiva, esta é que o possui. Ele está possuído pela raiva e seu aborrecimento corre perigo constante de se tornar um afeto terrível, porque é como se a anima estivesse preparada para descarregar suas chamas num depósito de gasolina à espera; e o homem irromperá numa emoção descontrolada e capaz de engolir qualquer um.

Jung observou que a anima pode ser considerada em ação sempre que emoções e afetos estão agindo no homem. Ele escreveu: “Ela intensifica, exagera, falsifica e mitologiza todos os relacionamentos emocionais com o trabalho dele e com outras pessoas de ambos os sexos”.

 O antídoto para isso, como já foi mencionado, consiste, para o homem, em saber o que ele está sentindo e tornar-se capaz de expressá-lo no relacionamento. Isso, mantém sua emoção longe das garras da anima e, além do mais, a satisfaz, mostrando-lhe que a coisa certa está sendo feita, seja quem for aquele a que o feriu ou ofendeu.

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